segunda-feira, 11 de julho de 2011

Ainda a Volta ao Burkina Faso

Podia ser o Tour, mas não é: cicloturistas em Torres Vedras

Em dia de descanso na Volta a França, ainda no rescaldo da etapa de ontem, que alguns media descreveram com frases coloridas como "a matança", vale a pena meditar um bocadinho sobre o que aconteceu. Diz-se que o carro que provocou o acidente com dois líderes da etapa transportava espectadores VIP´s, convidados da organização, possivelmente patrocinadores. O carro foi banido da prova, bem como o seu condutor. O mesmo tinha já sucedido com a moto que tinha derrubado o Dinamarquês Sorensen.  

E a coisa ficou por aí. A imprensa espanhola está a espumar de raiva, já que não só um dos prejudicados foi o Juan Antonio Flecha, como em consequência de todos os incidentes o lider do Tour é agora um Francês! Mas para lá do aproveitamento noticioso da carnificina (ver slide show da 9ª etapa), ninguém parece reflectir com seriedade sobre o que se está a passar. Quedas, ossos partidos, lesões e agora atropelamentos, as fotos do Tour parecem imagens de guerra: atletas caídos no asfalto, sangue e ambulâncias. Isto não pode ser considerado normal.

Se um qualquer ciclista tivesse sido albarroado da mesma forma em Portugal, um dos países da Europa com legislação que menos protege os ciclistas, as coisas ainda assim teriam sido diferentes. Para já o carro abandonou o local, ou seja, bateu e fugiu, o que é crime. A viatura foi identificada, pelo que seria possível participar o caso às autoridades, que entregariam o processo ao ministério público. A vitima também teria direito a levantar um processo civil ao infractor, de modo a força-lo a pagar indemnizações. Todos sabemos que a justiça portuguesa é tão lenta como ineficaz, mas as consequências para o automobilista seriam um pouco mais graves que ser "banido" de uma prova desportiva.

A verdade é que o condutor envolvido nem foi despedido. A empresa em causa não foi banida do Tour. O passeio de VIP´s para trás e para a frente ao longo das etapas não foi proibido. O número de carros da caravana não foi reduzido e as regras para a sua utilização não foram revistas. Na prática, nada mudou. E só os loucos podem esperar obter resultados diferentes fazendo tudo da mesma maneira.

Por seu lado, os ciclistas envolvidos e suas equipas não apresentaram qualquer queixa à organização. Nas ruas como na maior prova desportiva do mundo, o ciclista é suposto comer e calar. O próprio Johny Hoogerland, o holandês atirado para o asfalto a 60 km/h e que acabou retalhado numa cerca de arame farpado disse que são "coisas que acontecem". Levou mais de trinta pontos nas pernas mas não pretende desistir.

Não me entendam mal, nada me move contra a Volta a França. Aliás, se não fosse apreciador do Tour nunca me teria sequer apercebido destes acontecimentos. Eu sei que há uma certa violência que infelizmente faz parte das grandes provas de estrada. Mas acho incrível o nível de desrespeito pelos ciclistas que se atingiu este ano. O Tour, pela sua importância, não pode ser tão mau exemplo para milhões de pessoas.

3 comentários:

  1. Mas se são os interesses da organização, os patrocínios, os dinheiro que move estes, os gladiadores voltam à arena e o circo continuará a pegar fogo. Mudar algo no tour está nas mãos dos ciclistas.

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  2. Não vejo quase nada do Tour desde a dinastia Indurain. As imagens que colocaste aqui parecem mais de um rally!

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  3. Há uns anos atrás vi uma reportagem fantástica no eurosport que comparava o tour com a volta ao Burquina Fasso!!! O nível de empenho dos corredores e o espírito de camaradagem e interajuda eram qualquer coisa de espectacular. Os recursos eram tão escassos que se tornava quase trágico mas o prazer em correr e levar a volta até ao fim superava tudo. O vencedor era um autentico herói nacional. Lembro-me de alguns detalhes interessantes como por exemplo a alimentação que o vencedor fez durante toda a volta: bananas e água. só. não havia mais nada... corriam com bicicletas com mais de 9 remendos em cada roda!!!!! foi bem mais interessante que o tour...
    Abraço,
    Júlio

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