terça-feira, 26 de junho de 2012

London Calling, Pá!

Good evening! Depois do grande sucesso da revolução a pedal no nosso país, resolvi, qual Che Guevara, exportar a luta pelos direitos do ciclista para outras paragens. Ou foi isso ou estava a deprimir-me na velha e falida Olissipo quando fui convidado para passar o verão nessa solarenga estância balnear que é a cidade de Londres. Já não me consigo lembrar muito bem. Não tenho tomado o Centrum. Mas o importante é que cá estou.

Hora de ponta em Camden

Antes de começar para aqui a falar do que se passa em Londres, convêm que nos situemos. De acordo com o Eurostat, os utilizadores regulares de bicicleta em Londres rondariam cerca de 1% da população. Isso é o mesmo valor que o INE tem para Lisboa, embora eu tenha razões para duvidar dele. Estes números estão claramente a mudar aqui na capital do fish and chips, mas as semelhanças são claras. Em Londres o carro particular também é rei, embora os ingleses não tenham entrado na demência colectiva de eliminar passeios, parques e jardins para transformar tudo em vias rápidas e rotundas rodoviárias, como num certo país de comedores de bacalhau que eu conheço.   

As bicicletas estão longe de ser uma raridade em Londres

Imaginem que o trânsito londrino é denso e que os condutores são agressivos! Não tanto como em Lisboa, mas não é assim tão diferente. O espaço é reduzido e as pessoas competem por ele. O Adam Smith compreenderia. As ciclovias e ciclo faixas também não são assim muito diferentes das nossas: há mais e melhores, mas também começam em sítios estranhos, acabam de repente, andam por cima dos passeios, obrigam a voltas e zigue-zagues inexplicáveis, etc. A maior parte dos Londrinos opta por andar na estrada, e andar depressa. É o vehicular cycling de que já opinei por aqui.

Londres: double decker buses, black cabs e bicicletas do Boris!

Há por aí quem diga que a cycle scene londriana é a pior de entre as grandes capitais mundiais, no sentido em que os ciclistas são ultra-competitivos, uns aceleras incorrigíveis que nem para a sua própria espécie são bons. A palavra cutthroat resume bem o estado de espírito. Não sei se é uma crítica muito justa, é a própria natureza do trânsito aqui que é cutthroat, todo o trânsito, não apenas os ciclistas. Em hora de ponta, andar de metro ou comboio também é um tipo de experiência competitiva. A cidade tem simplesmente muita gente, e apesar do serviço de transportes ser excelente, está rebentar pelas costuras. Nas ruas é mais ou menos a mesma coisa.

Conseguem imaginar a CML a pagar por publicidade deste tipo?

Se estiverem perdidos, usem a sinalização para ciclistas

Por outro lado, a mera existência de ciclistas no trânsito já passou a ser uma coisa quase normal, algo que já se tornou parte do dia-a-dia da cidade do Thames. Há sinalização vertical para bicicletas, marcações no piso antes dos semáforos para os ciclistas, publicidade de prevenção rodoviária para ciclistas na rua, etc. Ainda assim, muitos londrinos, dos que não andam de bicicleta, parecem achar que circular no meio do trânsito num velocípede é uma espécie de loucura suicida, mas agora é uma loucura suicida diária e rotineira.


Just another day at the office, mate

O tipo de bicicleta preferida para estar aventuras do commuting parece ser mesmo a bicicleta de estrada, às vezes com um alforge impermeável pendurado de lado. Também há hybrids, muitas Bromptoms, e no centro, Boris Bikes. Os commuters londrinos enfrentam o caos rodoviário vestidos dos pés à cabeça em roupas reflectoras, alguns, ou de roupa desportiva completa, outros. O cycle chic não parece muito popular por cá. Mas existe. Para um apreciador de todas as coisas cicláveis, recomendo uma visita cá ao burgo, nem que seja para ficar uma tarde parado numa esquina do centro, em hora de ponta, a beber uma pint de cerveja e simplesmente ver a revolução passar.

Uma estação das bicicletas do Boris
 
Outra estação de bicicletas do Boris

Este vosso escriba vai narrar as suas experiências de Londres nos próximos tempos com alguma assiduidade, ao contrario das de Lisboa, que, há que admitir, estavam a sair ao ritmo de uma por mês. A qualidade será a mesma de sempre. Não esperem melhorias. Entretanto, mal posso esperar para deitar mãos a um guiador e juntar-me ao pandemónio. Amanhã vou ver umas bikes usadas. Agora se ao menos eu me lembrar de onde meti o Centrum...

2 comentários:

  1. O "vehicular cycling" em Londres não é bem uma opção dos ciclistas mas sim o resultado da maioria das ciclovias no RU serem ciclofaixas (e não ciclovias segregadas como na Holanda), isso explica também a ausência do cycle chic: os ciclistas sentem que estão num ambiente hostil. Londres e o Reino Unido não são em minha opinião bons exemplos neste campo, exceto talvez no que diz respeito ao sistema de bicicletas partilhadas.

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  2. Concordo que Londres não é um bom exemplo de cidade com condições para o ciclismo utilitário. Mas a situação é mais complexa: há organizações de ciclistas que se opõem à criação de ciclovias ou quaisquer infraestruturas, com medo de perder o direito a usar a estrada.

    E o cycle chic existe, como eu disse, mas é minoritário. É uma cidade em mudança e um processo a seguir com atenção, pois as semelhanças com Lisboa ainda são algumas.

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