terça-feira, 15 de maio de 2012

Mais km de ciclovias na Capital. Será?

Imagem ranhosa da CML. Estavam à espera de quê? Cartier Bresson?

A CML inaugurou esta segunda feira a ligação por ciclovia entre algumas das mais importantes, históricas, populosas e dinâmicas zonas da cidade de Lisboa. Refiro-me obviamente à ligação Quinta do Alemão e o Parque da Belavista e à ponte pedonal e ciclável entre o Parque da Belavista e as Olaias. Esta parceria com o Rock in Rio vai permitir ainda estacionamento seguro para bicicletas durante 5 dias inteiros do evento, mais ou menos o mesmo tempo que a ciclovia terá alguma utilização.
 
O da esquerda é o nosso presidente da câmara. A sério!

Estes nossos representantes camarários, que a julgar pelas fotos se vestem às escuras, continuam a inaugurar "ciclovias" que começam no meio de nenhures e acabam onde poucos querem chegar. Vale tudo, desde que outros paguem a conta. Agora foi o Rock in Rio, mas já foi a Galp, ironia das ironias. E sobretudo, desde que se façam longe das principais vias de comunicação, que é para não se correr sequer o risco de se retirar algum espaço aos automóveis. Coisas como ligar o Saldanha ao Cais do Sodré ou o Marquês do Pombal a qualquer sítio relevante, não parecem fazer parte desta visão muito particular de mobilidade em bicicleta que estes Fashion Trendsetters têm para Lisboa. 

Não importa de que tipo seja: um viaduto dá sempre votos, quero dizer, jeito.

Repetir até à exaustão que se pretende incentivar o uso da bicicleta em Lisboa não transforma a afirmação em algo parecido com... como é que se diz? A verdade. Pois. E enquanto se inauguram estas mal pensadas estruturas, algumas das já inauguradas e igualmente mal pensadas ciclovias-lúdicas-em-cima-do-passeio-para-a-malta-gorda-dos-subúrbios-andar-quilómetro-e-meio ao fim de semana quando faz sol vão sendo progressivamente invadidas pelo automóvel.

Eu gostava que o Sr. Sá Fernandes experimentasse dar uma volta por estes percursos que a sua barriga tanto apregoa, para ver se são lógicos, práticos ou sequer seguros. Nem digo de noite, também não queria que o homem morresse, mas mesmo de dia, nos últimos tempos, o troço entre Belém e Alcântara da famigerada Ciclo-coisa de Belém tem estado assim:

Não reparei se aquele papelinho era uma multa, mas duvido
 
A zona ao pé do museu da electricidade virou uma autentica pocilga

Pois é, o Império contra-ataca. O que parece território libertado pode muito bem desaparecer de volta para o jugo do tirano num piscar de olhos. E assim os números de quilómetros que a câmara vai anunciando de ciclovia na capital têm de ser revistos, porque há pedaços que estão rapidamente a deixar de ser ciclovias perigosas e inúteis para nem serem ciclo-coisas de todo. 

E enquanto a malta se entretém com as espinhas, o Sr. Automobilista da casta superior vai comendo bifinho do lombo. Duvido que a coisa mude depressa, estou a fazer um trabalho sobre mobilidade sustentável para uma cadeira de Sociologia Urbana e tive uma reunião com a professora sobre o assunto. Ela desatou logo a falar em parques, jardins e esplanadas... Não sei de onde vem esta gente, mas acho que vêm todos do mesmo sítio.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Projecto "Excepto Bicicletas"

Conhecem?

No âmbito do Orçamento Participativo, a comunidade ciclo-motivada da capital prepara-se para apresentar propostas que beneficiem a mobilidade a pedal em Lisboa. Quebrando a tradição do Lisboa Bike de ficar confortavelmente de fora a falar mal do que se vai passando, desta vez resolvi envolver-me num dos projectos.

No estrangeiro é assim. Imagem: Gabriel J. www.weloveprovence.fr/

Resumidamente, vai-se propor à câmara uma série de alterações à sinalização vertical que beneficiem a progressão dos ciclistas em zonas onde não existem infraestruturas segregadas, vulgo ciclovias. Essencialmente são excepções em sentidos únicos, pensadas de forma integrada, criando percursos alternativos, de maneira a agilizar a circulação do ciclista urbano. Na práctica vamos dizer à CML quantos sinais serão necessários e indicaremos os locais precisos onde estes deverão ser colocados.

Os critérios para colocar os sinais são muito simples e são os seguintes:
  • Ruas de uma só faixa. 
  • Falta de alternativas viáveis próximas.
  • Pouca inclinação (Deve ser possível subir com uma bicicleta de cidade sem mudanças)
  • Sem restrições de inclinação no caso de ser a descer.
  • Largura da rua deve permitir a passagem segura.

A fase inicial é a identificação dos locais num mapa da capital. Se alguém conhecer localizações propicias e quiser colaborar nesta tarefa pode inscrever-se nesta lista e solicitar acesso ao mapa.

Ao contrário do que muita gente parece pensar, não existe nenhuma indefinição legal que limite potencialmente a aplicação desta proposta por parte da câmara. Na realidade, a própria CML já sinalizou pelo menos um local desta mesma forma, um local que a maioria dos ciclistas de Lisboa bem conhecem, de onde foi tomada a imagem inicial:

Parte da afamada ciclo-coisa Belém-Cais do Sodré

Símbolos misteriosos para o automobilista perceber que não é tudo dele

O lado da entrada está também devidamente sinalizado

O Orçamento Participativo tem sido alvo de muitas críticas pela demora na implementação dos projectos aprovados, e nada me seria mais fácil que vir aqui arrasar com críticas fundamentadas e pertinentes o comportamento da CML neste capítulo. Penso, no entanto, que será bem mais produtivo continuar a insistir e a pressionar a câmara, por todas as formas possíveis, para conseguirmos por fim um razoável nível de segurança e praticabilidade para as deslocações em bicicleta. Esta será uma dessas formas. Conto com a vossa ajuda. (O diz-que-é-uma-espécie-de-humor-corrosivo volta dentro de momentos)

terça-feira, 8 de maio de 2012

Transportes Públicos de Lisboa

Bem vindos à Capital! (do carro importado)

Tenho recorrido mais do que o costume aos transportes públicos. Não é a primeira vez que aqui me refiro aos ditos cujos. Os transportes públicos são excelentes complementos para ciclistas urbanos que não possam realizar a totalidade das suas deslocações de bicicleta, coisa razoável e compreensível, numa cidade tão carro-dependente como Lisboa e seus orgulhosos subúrbios. Eis portanto um breve comentário aos operadores de transportes públicos da capital do império e arredores:

Quando no 15, segurem a carteira. Com as duas mãos.

Carris: Não sei o que fizeram aos motoristas da Carris, mas a verdade é que mudaram muito nas últimas décadas. Eu ainda sou do tempo dos Volvos com suspensão manhosa, em que o motorista de camisa aberta até ao umbigo e cabelo lambido seguia descontraidamente à conversa com tipos de aspecto duvidoso, sobre temas que saltavam do penalti e do fora de jogo para a tranca e a prateleira da vizinha, (passando pela bilha), enquanto faziam manobras perigosas dignas de envergonhar um Nelson Piquet, sempre sem deixar cair o palito do canto da boca. Hoje em dia os motoristas são bem mais profissionais. Alguns são tão profissionais que são senhoras! E alguma coisa lhes ensinam lá na Faculdade da Carris, já que esta nova geração de choferes mostra respeito pelo ciclista, mesmo quando este ocupa as faixas BUS, que infelizmente ainda não são território libertado para a Causa. É possível transportar bicicletas dobráveis na Carris, dependendo da sua dimensão e da lotação que o autocarro ou eléctrico tenha no momento, sendo o condutor o juiz e decisor final. Notavelmente há também algumas carreiras que aceitam bicicletas convencionais, o procedimento nestes casos é entrar com a bicla pela traseira, deixa-la segura no sítio correspondente e depois validar o título.

No autocarro ou no eléctrico, uma dobrável é uma boa aposta.

Em Cascais, os comboios são os mesmos de 1958. As tarifas é que não.

CP: As pessoas que só falam das dívidas astronómicas da CP, e das reduções da circulação, com linhas a fecharem pelo país fora e sei lá mais o quê, no fundo não percebem esta empresa. A CP é na realidade uma obra social. Promoveu o proletariado a classe média alta (os maquinistas, revisores, etc), dá emprego aos membros das classes altas e elites dirigentes com deficiências (cognitivas), que não conseguem arranjar trabalho numa empresa a sério, e até tiraram marginais das ruas, vejam o caso dos seguranças do Cais do Sodré, que passaram de aterrorizar velhinhas na estação a andarem de farda e... aterrorizarem velhinhas na estação. Mas também pudera, as senhoras têm a lata de fazer perguntas! Tanta despesa com a mobilidade social deixa pouco para a mobilidade que mais deveria interessar à empresa: o material circulante está velho e cansado, os funcionários gostam mais de fazer greves do que de trabalhar. Apesar de tudo isso, o comboio continua a ser o melhor complemento para o ciclista urbano. É possível levar a bicicleta gratuitamente de e para Lisboa, desde que esta caiba na carruagem das composições suburbanas. Obviamente que em hora de ponta será complicado, mas por enquanto ainda é fácil arranjar um horário em que seja pacífico fazer a viagem, sobretudo na linha de Cascais. O sistema de máquinas de bilhetes é especialmente lento e em algumas estações não funciona. Há cada vez mais gente a andar sem pagar, por causa da crise e porque com as novas tecnologias o revisor se move à velocidade do pensamento. Do pensamento do Jorge W. Embuste, claro.

Imagem de casadoquintal.blogspot.pt

Scotturb: Se a Carris evoluiu, estes camaradas regrediram. Para aí até à idade da pedra. Os motoristas parecem não só terem um grande desilusão em exercer a sua profissão, como demonstram sempre que podem o seu desprezo pelos utentes. O que se compreende, claro, pois só um barra-botas sem eira nem beira é que se faz deslocar de autocharro pelos subúrbios da capital. E servir de motorista para um bando de velhos, crianças e pobres não é coisa de um macho latino com pelo na venta que se preze. Para se vingarem da miséria de vida que o destino lhes reservou, os machos da Scotturb exibem a sua destreza conduzindo em excesso de velocidade permanente, aterrorizando os turistas que vieram a Sintra gastar as suas divisas e provocando mais acidentes que qualquer outra empresa do sector. Ciclistas, acautelem-se na presença destes paquidermes, pois eles adoram medir forças com os mais fracos. Não sei se é possível transportar bicicletas nesta companhia do Burkina Fasso, mas não aconselho ninguém a tentar.

Levaram uns anos, mas lá conseguiram. E o Zapping, pá?

Vimeca/LT: Os camaradas da Vimeca e Cia. não fazem greve. Os autocarros andam limpos, (excepto quando entram no 12 cento e oitenta crianças da escola secundária de Linda-a-Velha), os motoristas são educados e a coisa em geral funciona bastantes degraus acima dos colegas da Scotturb. O problema são os preços praticados nos bilhetes e passes: escandalosamente caros! E os bilhetes pré-comprados passavam a vida a mudar e ficar inválidos antes de uma pessoa ter tempo de os gastar, sendo os motoristas inflexíveis. É que a Vimeca é privada e como tal vê cifrões antes de qualquer outra coisa. Actualmente a empresa adoptou o Viva Viagem, mesmo que não seja possível utilizar-lo em Zapping. Bicicletas não estão previstas no menu, é possível levar uma dobrável pequena, desde que o motorista não considere que ela estorva.

Imagem: Jornal de Notícias

Metro: Não se deixem enganar pelas estações cheias de arte e as plataformas limpas e bem iluminadas. Isto é pessoal que também gosta da sua patuscada e da sua manifezita. Especialmente agora com o PREC. Para este mês já estão programados dois dias de greve. Não apareçam com bicicletas numa estação de Metro em Lisboa, que não vale a pena. Primeiro os acessos dão tanto trabalho que mais vale enfrentar a selva de enlatados lá fora, e segundo há restrições de dias e de horas que eu nunca me dei ao trabalho de tentar perceber. Se mesmo assim aparecerem com uma bicla numa estação do Metro, serão alvo de uma placagem imediata por parte de funcionários em equipamento anti-motim, especialmente de prevenção contra essa terrível ameaça especifica que são os vândalos de licra. Talvez estas equipas de prevenção expliquem o porquê dos átrios e plataformas estarem sempre vazios de funcionários. E nem pensem em ter problemas com os cartões magnéticos nos portais, ficam lá presos até ao Natal.   

Fertagus é fixe. A sério!

Fertagus: O comboio que vai para o grande deserto do Sul também é um business privado, pelo que os seus funcionários não fazem greves, não fazem pausas e não fazem favores. Felizmente as composições têm lugares específicos para bicicletas, normalmente 4 no total, cujo transporte é também gratuito. Os lugares de bicicletas competem no entanto com cadeiras de rodas e carrinhos de bebé. Normalmente sobram lugares, mas eu já vi uma senhora a espumar de raiva e abandonar o comboio porque a minha Kona estava a ocupar o lugar que ela pretendia para o bólide do seu rebento.

A biciclete não pode ir aí!!!! Ponha daquele lado!!!

TransTejo: Ora aqui está uma empresa cheia de potencial. Afinal há montes de espaço dentro daqueles barcos, certo? Certo?? Errado! Existem várias limitações de carreiras e de horários, e os funcionários não se conseguem decidir sobre qual o lugar adequado para colocar a bicicleta, lugar esse que, naturalmente, não está assinalado. Há também uma estranha tendência para falar aos gritos com os ciclistas, que como toda a gente sabe, além de serem excêntricos e de gostarem de roupas justas, são duros de ouvido. Os acessos nas estações obrigam muitas vezes a malabarismos nos portais de entrada, ou à necessidade de recorrer a alguém (o cada vez mais raro funcionário de carne e osso) que nos possibilite a entrada.

Bicicletas a bordo de um catamaram da TT.

Em conclusão, muitas mudanças houve nos últimos anos nos sistemas de transportes da capital. Infelizmente a mentalidade continua a mesma: implementa-se um sistema de bilhetes intermodal, mas persistem inúmeras restrições ao seu uso nas diferentes empresas. Apostou-se na tecnologia, lavou-se a cara, mas aqui e ali ainda assoma aquela mentalidade do "serviço para desenrascar os pobrezinhos" que não podem andar de carro. No que toca especificamente às bicicletas, por convicção ou imperativos de imagem, quase todos os operadores oferecem soluções. Há restrições maiores ou menores, alguma ausência de informação e procedimentos inconsistentes e faltam lugares de estacionamento em estações e paragens. Mesmo assim penso que as empresas fizeram um esforço muito maior para incorporar o transporte de bicicletas na sua realidade diária do que a própria CML alguma vez fez para aproximar a bicicleta da  realidade urbana. Quanto ao utilizador, quem dispõe de horários flexíveis pode evitar as horas de ponta e tirar o máximo partido das opções que descrevi, quem está preso a horários e percursos mais convencionais pode sempre optar por uma boa bicicleta dobrável.