quarta-feira, 29 de agosto de 2012

London Cycle Videos

Aviso: Posta preguiçosa.

Pedalar em Londres, essa experiência mística. Aqui ficam uns vídeos sobre como é circular de bicicleta nas ruas da capital do Reino Unido.

Como o Transport for London pensa que é:



O Mayor de Londres e uma das "suas" Boris Bikes a caminho do trabalho:



Como o verdadeiro Mayor Boris pedala:



Como é realmente pedalar em Londres. Mais ou menos:


Uma pesquisa rápida na Internet revelará uma inesgotável quantidade de vídeos ingleses com insultos a ciclistas ou mostrando acidentes ou situações de conflito. Acreditem que a realidade não é tão má como parece.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Retro-Ciclismo-Veicular na velha Londinium

Do tempo em que os homens eram homens e Shimano SIS era material do bom

Depois de terem lido que eu tenho usado uma ancestral bicicleta de estrada inglesa nas ruas de Londres, um dos meus dois assíduos leitores pode ter-se questionado sobre como será a experiência. Ou não. Seja como for, resolvi falar disso.

Nunca tinha andado numa bicicleta de estrada por mais do que uns minutos, por isso o tipo de bicicleta em si era uma novidade para mim. Tal como meter mudanças com shifters no quadro. Ou ter travões que na verdade não travam, só abrandam. Ligeiramente. Às vezes.
 
 
A blast from the past

Nunca acreditei muito nas potencialidades utilitárias das bicicletas de estrada, com os seus quadros frágeis e componentes ultra leves. Excepto talvez as mais antigas, fininhas mas em aço, com maior tolerância para pneus largos, guarda-lamas, e outros extras práticos. O ciclismo veicular exige velocidades elevadas, para tentar acompanhar o trânsito motorizado e isso faz com que as bicicletas "rápidas" sejam especialmente desejadas por cá. E na prática, só há dois tipos de bicicletas rápidas: híbridas leves e bicicletas de estrada, em todas as suas variantes.   

Park it like a boss!

Aqui é muito fácil encontrar dispendiosos modelos em carbono amarrados a postes. É o que as pessoas usam para ir para o trabalho. Também há muitas empresas que têm balneários com chuveiros e isso faz com que os commuters possam ir vestidos de licra e suarem tudo o que quiserem a caminho do trabalho. Muitos chamam-lhe treino.

Uma impressionante percentagem destas bicicletas nem sequer têm guarda-lamas, numa cidade famosa pela sua pluviosidade. Justificadamente, devo dizer. Mas o que interessa mesmo é falar da experiência, como é rolar no meio do trânsito londrino numa bicicleta de estrada com 30 anos? É porreiro. Pá. É assustador ao princípio, quando se sabe que a bicicleta não trava nada de jeito, travões dos anos 80 têm dessas coisas, mas com o tempo vamos ganhando experiência e habituei-me a antecipar os problemas, para não ter que travar muito.

Toda a gente em Londres pedala rápido. Muito rápido. O trânsito motorizado, por sua vez, circula a um ritmo um bocadinho menos criminoso que em Lisboa. Uma bicicleta de estrada consegue acompanhar o trânsito urbano daqui com alguma facilidade, mas isso obriga a uma postura mais agressiva e a um ritmo forte. Se o percurso não for curto, é impossível chegar apresentável ao destino. A Raleigh é divertida de pilotar e suficientemente estável para inspirar confiança entre os mastodontes enlatados.

Não ter suspensão não é um problema tão grave como em Lisboa. Aqui as crateras são mais pequenas e não existem carris de electrizo. O aço absorve mais vibrações que o alumínio. E os pneus mais largos que instalei, 700x28, tornam a ride confortável quanto baste. E muito rápida. De resto, Londres é quase plana, pelo que as 12 mudanças chegam e sobram. Na prática não preciso de mais que duas ou três. A posição dos shifters antigos torna mais lenta a operação de trocar de relação de transmissão. Também neste capítulo se progrediu muito desde mil novecentos e oitenta e troca o passo. Mas como disse, as mudanças são quase desnecessárias, esta é uma cidade ideal para a simplicidade de uma single speed.

A qualquer interessado em saber mais sobre bicicletas de estrada old school, recomendo a leitura das palavras do mestre.

sábado, 25 de agosto de 2012

O que Londres tem e Lisboa não?

Londres, num dia qualquer

Muita chuva? Mais pontes? Menos carros? Sim. Definitivamente. E até isso tem impacto no dia-a-dia do ciclista londrino. Estabelecer paralelos entre Londres e Lisboa é ao mesmo tempo fácil e difícil. Há diferenças e semelhanças bastante evidentes, e outras algo mais subtis, como já tinha abordado aqui. Entretanto passaram muitas luas, e acho que posso fazer uma abordagem mais profunda. Vamos então por partes, como faria um histórico vilão local.

A Bicycle Culture

A ghost bike também é sinal de uma bicycle culture

Sim, em Lisboa temos malta que faz ciclo-oficinas-coisas e temos uns activistas hardcore que se juntam no Marquês de Pombal na última sexta feira de cada mês para recordar aos enlatados que os ciclistas são esquisitos. Ou qualquer coisa assim. Não que eu tenho nada contra. Eu sei que eu sou esquisito, foi o Carlos Barbosa que disse, ele nunca se engana. Temos uma comunidade de interessados que defende vagamente os mesmos ideais, mas que não consegue chegar a acordo sobre coisa nenhuma. Temos o MUBI e a FPCUB. Temos uma ou outra loja com personalidade e visão para lá do lucro. E os Londrinos?

É como eles se chamam!

Bom, em Londres eles têm o Look Mum no Hands, uma espécie de loja-café-ponto de encontro para a malta que leva o ciclismo "a sério". Pode-se pagar uma exorbitância por um latte e ver o Tour num grande ecrã. Há a nova loja da Rapha e muitas outros estabelecimentos, uns pertencem às grandes cadeias do dark side do capitalismo e algumas outras que são mais como a mercearia do bairro, onde o crabon nem sempre é o material de eleição. É claro que isso é importante, mas as lojas existem porque há ciclistas.

À frente no semáforo

Um "Taxi", perto de Trafalgar

Paramédicos e Policia de Londres, de bicicleta
 
São uma minoria, como em quase todo o lado, mas uma minoria perfeitamente visível. São desportistas, commuters, hipsters, activistas e guerreiros de fim de semana. Estão por todo o lado, dominam os semáforos nas horas de ponta e não se intimidam com os taxistas, os autocarros e o man-with-a-van.

Bicicleta no Museu da Ciência de Londres: uma Brompton!


A revolução pode estar em curso, mas Londres nunca deixou de ter bicletas e ciclistas. Agora pode estar mais na moda e haver mais facilidades, mas o império do automóvel british style sempre teve de coexistir com os ciclistas. Por outro lado, como em Portugal, os ciclistas também são olhados de lado por uns e mesmo odiados por outros. Porque são uma "ameaça", porque ignoram os semáforos, porque não pagam impostos, porque furam o trânsito e passam à frente dos carros, porque são diferentes. Por mais ódio que exista, e há algum, é óbvio que os ciclistas estão aqui para ficar.

O Espaço Físico  

Sim, isto é em Londres. Um de muitos parques urbanos

Sejamos claros. Londres é muito diferente de Lisboa na forma como lida com o espaço público. Aqui sempre existiram zonas e ruas exclusivamente pedonais. Percursos pedestres interditos a veículos motorizados e jardins públicos de grande dimensão existem por toda a parte. Há canais com percursos pedestres e cicláveis. Todas as pontes, excepto as ferroviárias, podem ser atravessadas a pé ou de bicicleta. Em Londres não é normal que o cacique local entregue todo o centímetro quadrado disponível para construir prédios ou centros comerciais e fazer os sempre tão importantes acessos rodoviários que trazem o "progresso". São tão atrasados estes Ingleses.

Outro "Park", não muito longe do anterior

Assim, façamos pois uma lista de coisas que faciclitam a vida ao ciclista londrino:
  • Há passeios por toda a cidade, livres de automóveis (Imaginem!!)
  • Parques públicos extensos, podem ser atravessados de bici
  • Canal Paths
  • Ciclovias segregadas ou partilhadas
  • Ciclofaixas
  • Estacionamento para bicicletas abundante
  • Sinalização vertical clara e constante
  • Sinalização luminosa
  • Marcas rodoviárias específicas
  • Cidade quase plana. Quase...

Rua cortada ao trânsito num dos lados...


...garante que apenas os residentes e ciclistas circulam na rua
 
O Ambiente Rodoviário 
 
Talvez mais importante que estes "pormenores" do espaço, é o facto de aqui as regras em geral serem respeitadas. Carros encima do passeio, razias a ciclistas, excessos de velocidade grotescos, tudo isto também existe, mas muito menos que em Lisboa. E a inexplicável e constante agressividade portuguesa ao volante, isso felizmente quase não há.

Just beware of the BUS!

Os automobilistas em geral respeitam as bicicletas enquanto veículo. Não concedem facilidades, mas também não usam da intimidação. Esperam em cruzamentos quando não têm prioridade. Esperam se não houver espaço para ultrapassar numa rua estreita. Buzinadelas "saí da frente" são muito raras.

Excepções para ciclistas

O ciclista é considerado na elaboração de percursos
 
Abundam as zonas de 20 e 30 milhas por hora. E as ruas de sentido único ou mesmo fechadas ao trânsito motorizado. O estacionamento no centro é praticamente inexistente. A congestion charge também ajuda a manter a praga de enlatados sobre controle. Nada disto existe em Lisboa, onde na prática não só não se reprime nem se fiscaliza nada, como ainda se promove o uso do carro na cidade, com abundância de faixas de rodagem e hectares de estacionamento público gratuito, ou quase. 

O Ambiente Político e Institucional


Sul de Londres: cartaz pago com dinheiros públicos a incentivar o uso da bicicleta

Toda a gente sabe que o sempre colorido Mayor de Londres circula, pelo menos ocasionalmente, de bicicleta. Não será só por isso, mas é perfeitamente claro que existe uma visão estudada para onde se pretende caminhar em matéria de mobilidade ciclável em Londres. O sistema de bicicletas de uso partilhado, conhecido em todo lado como "Boris Bikes", está integrado na toda poderosa TFL, a instituição que gere todos os transportes da capital britânica. Eles fazem coisas fixes como publicitar em campanhas o bom que é andar de bicicleta, divulgam avisos sobre os perigos comuns para o ciclista e até fornecem mapas da cidade gratuitos, especialmente pensados para ciclistas.

O objectivo é simples: aumentar o número de utilizadores de bicicleta na capital Britânica. E aqui, as palavras não andam tão divorciadas das acções como em Lisboa.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

English Steel: Raleigh Eclipse 12 Speed

Tenham medo. Tenham muito medo!

Yep. Este monte de ferrugem é a minha nova montada em terras de sua majestade. Mas não deixem que a ferrugem vos iluda, esta enorme máquina é muito confortável e assustadoramente rápida. Algumas alterações foram necessárias, os pneus por exemplo eram os de origem, estavam num estado deplorável e tiveram que ser trocados. Aproveitei e coloquei uns pneus 28, um pouco mais largos que os 25 de origem, impossíveis de encontrar no dias que correm.

Os componentes do dinossauro são os seguintes:

  • Quadro: Aço Reynolds 501 double butted; 24,5 Polegadas
  • Transmissão: Shimano SIS (Cassete 6, pedaleiro duplo 42-52)
  • Cranks: Sakae SX 175mm
  • Rodas: Cubos Mallard e aros Alesa (frente) e Rigida (atrás)
  • Avanço: Sakae
  • Guiador: 40cm
  • Travões: Weinmann
  • Selim: Selle Italia

O quadro provavelmente é demasiado grande para mim, 24 polegadas é muita polegada. Mas o tamanho anunciado era outro, imagino que deve ser difícil vender uma bicla deste tamanho, mesmo na terra dos bifes gigantes. Seja como for, com alguns ajustes consigo circular confortavelmente. Tudo funciona como deveria, há uns ruídos do cubo traseiro, mas as rodas rolam bem, e as mudanças não precisaram de qualquer afinação. O desviador da frente não funciona de forma indexada, mas isso não constitui qualquer problema, acho que até prefiro.

Onde se notam os quase 30 anos de idade é na travagem. É positivamente jurássica. Calipers de um só pivot e os calços de origem, duros que nem uma pedra, não constituem a melhor receita para parar esta máquina infernal. Mais desenvolvimentos em breve, se eu sobreviver.

sábado, 4 de agosto de 2012

Londres Olímpica e o Ciclismo Utilitário

A tocha olímpica faz o seu caminho pelo norte de Londres

Levou o seu tempo, mas os Ingleses lá se entusiasmaram com os Jogos. Quando aqui cheguei, há mais de um mês, predominava a indiferença e o sarcasmo. As pessoas queriam era fugir de Londres para evitar o apregoado caos eminente. Com o aproximar da data do inicio dos jogos as coisas foram mudando gradualmente. Agora pode-se dizer que a maioria dos locais está visivelmente entusiasmada, quando não mesmo obcecada com os resultados dos jogos. E há três dias atrás, Bradley Wiggins ganhou a prova de contra relógio de estrada, depois de ele próprio, vestido de amarelo, ter dado inicio à cerimonia de abertura no dia 27 de Julho.

As patilhas mais rápidas do universo a caminho do ouro olímpico

E este fulano também andou por lá...


Depois da decepção do sábado passado, quando as esperanças dos Ingleses numa vitoria do sprinter Mark Cavendish na prova de estrada foram goradas, segundo as reclamações do próprio porque toda a gente queria que o Team GB perdesse, as patilhas mais rápidas do universo conhecido restauraram a honra entre as hostes da casa. Desde essa altura parecem ter sido abertos os portões dourados e a comitiva da britânica não para de subir na tabela das medalhas, incluindo mais algumas contribuições do ciclismo de pista.

Isto foi o que eu consegui ver da prova de estrada. Diz que ganhou o Borat...

Toda esta glória olímpica parecia ser literalmente ouro sobre azul, numa cidade de Londres onde se vive uma muito visível revolução movida a pedal. Há quem considere que o sucesso do ciclismo "desporto" é uma boa promoção para o ciclismo "transporte". Essa ligação é pouco clara, como já aqui referi, mas não se pode facilmente negar que ela existe.



Não é por isso de estranhar que quando (mais) um ciclista urbano foi esborrachado por um autocarro perto do parque Olímpico na quarta-feira, os jornalistas apressaram-se a saber a opinião do ciclista mais famoso da velha Albion. Talvez surpreendido pela pergunta, o novo ídolo Londrino recitou uma série de lugares comuns sobre "segurança" e o uso do capacete. A sensibilidade da questão do capacete não é reconhecida pela maioria das pessoas fora da cycling community, e cheira-me que o campeão britânico, como muitos outros atletas, não usa a bicicleta para transporte há muitos anos.

Conversas que só podem acabar mal: política, religião e... capacetes.
 
Posteriormente, Bradley Wiggins queixou-se de ter sido mal interpretado, mas o estrago estava feito. O seu companheiro que se dá menos bem com as olimpíadas, Mark Cavendish, parece ter uma opinião mais ponderada sobre o assunto: presuma-se sempre que a culpa é do veículo motorizado e terão parte do problema resolvido. É o que sucede em países como a Holanda, mas é claro que esta ideia parece demasiado radical em muitas culturas dominadas há décadas pelo automóvel. Referir que essa é a prática nos países onde o ciclismo tem mais adeptos e é estatisticamente mais seguro parece não servir de muito.

Há dias em que até este homem tem receio de andar na estrada
 
Focar a questão nos capacetes é uma "solução" típica de uma sociedade auto-centrada. O Bike Snob fez umas observações bem interessantes (e sarcásticas, como habitualmente) sobre esta questão. O problema é que por muito à frente de, por exemplo, Lisboa, que Londres esteja, toda a questão da mobilidade em bicicleta é encarada como se de carros se tratassem. Eis uma noticia bombástica: uma bicicleta não é um carro. Dificilmente atinge velocidades perigosas. Não tem uma gaiola metálica e para-choques, não tem zonas de deformação programada, não tem airbags. Um capacete nunca substituirá nada disso. Misturar ciclistas com automóveis e camiões em ruas com muito trânsito, num ambiente implicitamente competitivo, por muita boa vontade que exista, vai ter sempre consequências graves para os mais fracos.

Esta é a companhia habitual do ciclista em Londres

Não só a relação com o desporto pode passar a imagem de que o ciclismo utilitário é coisa de "atletas" e de adeptos do risco e da adrenalina, como o ciclismo utilitário está agora pendente da opinião pouco esclarecida destes campeões, que no dia a dia andam de carro pela cidade. Circular de bicicleta deveria ser uma actividade normal, tão normal e segura como qualquer outra forma de deslocação. Enfiar capacetes à força em toda a gente vai tornar o ciclismo seguro? Como? Em Londres praticamente toda a gente já usa capacete. E reflectores, da cabeça aos pés. E luzes a piscar mesmo de dia.

Pernas descobertas? Está mesmo a pedi-las para levar com um autocarro em cima!

Eu sei que após tantos anos de auto-dependência custa a perceber que os veículos motorizados são intrinsecamente perigosos e que deveriam existir regras muito mais estritas a regular e limitar o seu uso. Parece ser mais fácil oprimir e ignorar a minoria do que tentar resolver o problema de uma forma objectiva. Até porque, de uma perspectiva eminentemente lógica, a única solução seria a segregação total. Do trânsito motorizado, naturalmente.