segunda-feira, 27 de junho de 2011

Um comentário aos comentários

Imagem: Mário Cruz/Lusa

Se as mais de 7000 pessoas que atravessaram a ponte Vasco da Gama a pedalar pareceram não incomodar muita gente, os escassos 200 que também ontem pedalaram em trajes menores pelo centro de Lisboa estão a levantar muita polémica. A blogosfera e os jornais online estão inundados de artigos e comentários sobre o evento, sobre a problemática da nudez e até, imagine-se, sobre a questão do ciclismo utilitário em si.

Como sempre, o portuga farta-se de reclamar, mesmo quando nada sabe do assunto sobre o qual decide pronunciar-se. Em geral, as críticas podem agrupar-se em grandes grupos:

  • Os Pseudo-Pudicos. Ficaram ofendidos pela nudez e a grande ameaça para a sociedade que ela representa. Não perceberam a mensagem, mas acham que isto é pessoal esquisito que quer só chamar a atenção. Como se essa definição diferenciasse os 200 de uma qualquer equipa de futebol ou um comício político do PS.
  • Os Activistas dos Direitos do Volante.  Alguns membros da máfia com mais capangas do mundo até perceberam a mensagem e lá vieram com os argumentos do costume: as bicicletas nem deviam andar na estrada, bla, bla, bla, os ciclistas não pagam impostos, bla, bla, bla (inserir diarreia mental aqui).
  • Os Donos da Deontologia Jornalística. Há sempre mais papistas que o papa, e há quem diga que os jornais e as televisões deviam ter mais que fazer que ocupar espaço e tempo com noticias deste tipo. Que são coisas que não interessam a ninguém e que excêntricos a fazer excentricidades não deveriam ser noticia em meios sérios.
  • Os Modernos. Acham que é prova da nosso atraso crónico e provicianismo militante que se tenha proibido a nudez aos manifestantes. Dizem que essas coisas só acontecem em Portugal e que o mediatismo que o evento alcançou reflecte esse também o nosso puritanismo arcaico.
  • Os Anti-Ecologia. Não falta por aí malta que acha que não há problema nenhum com o nosso ar, nem com o mar e os rios, nem com as florestas nem com os animaizinhos e que o petróleo dura para sempre. Toda afirmação em contrario é coisa de ambiento-fascistas/comunistas na sua tentativa de dominar o mundo. Estes senhores condenaram o evento aparentemente por ele ser percursor de um escravizar das pessoas, forçando-as a andar de bicicleta.

    Pois eu não participei mais por esquecimento que outra coisa. Não acho que seja uma ideia radical e os organizadores de este e outras iniciativas similares só não têm todo o meu apoio porque eu tenho noção do país em que vivo. Mesmo assim estou surpreendido com as reacções.

    Por um lado a publicidade é excelente e sempre boa: parabéns a quem arriscou um escaldão para estar presente.

    Por outro, fui forçado a relembrar como muitos portugueses só recentemente saíram das cavernas. E alguns aparentemente têm saudades.

    Lisboa Bike does Tróia

    Enquanto o mundo ciclo-activista lisboeta se ocupava com a travessia de uma ponte qualquer ,aos milhares, e um número mais reduzido, mas certamente mais empenhado, tirava a roupa por uma boa causa, este vosso escriba rumou à terra da abundância.

    I went to Tróia and all I got was this lousy photo

    Apesar dos melhores esforços do homem choné, passei cerca de 22 horas na "nova" Tróia. Teria gostado de ficar mais um bocadinho, mas mesmo sendo alimentado e abrigado por amigos, o dinheiro acabou. Com passagens do Ferry a 5 Euros, mais caro que um bilhete de comboio Lisboa-Setúbal, a primeira impressão é mesmo a mais acertada: Tróia não é para o povo. Para irritar a malta da Sonae, fiz questão de ir para lá de bicicleta, que como toda a gente que tem um Audi sabe, é o modo de locomoção dos destituídos.

    De Almada a Setúbal, pela N10, o percurso é relativamente seguro graças a uma pequena berma, quase sempre presente. A distância pouco supera os 40 km e o maior problema é navegar o mar de entradas e saídas de vias rápidas que há por aquelas bandas, e os seus respectivos utilizadores. A zona do nó do Seixal é particularmente perigosa.     

    Aproveitei as minhas escassas horas na Península com o nome da mítica cidade grega para comer gelados e ir à praia. Mas o que mais fiz foi passear de bicicleta. Não sei se essa actividade arcaica e proletária ofende o grande timoneiro do consumismo português, mas o certo é que há por lá uns caminhos e uma excelente ciclovia de 5 km bem cycle-friendly. Estranhamente, o resort de Tróia é muito menos friendly para os automóveis. Imagine-se que é impossível estacionar em cima do passeio em frente ao supermercado local! E a maior parte do estacionamento é pago. Como conseguirá um português sobreviver?

    A minha teoria é que a Sonae não quer lá portugueses. Seja pelas ruas bem desenhadas, com prioridade aos peões e à circulação a pé e de bicicleta, seja pelas muitas zonas verdes e espaços públicos de qualidade, ou ainda pelas grandes restrições para os automóveis, em termos de velocidade máxima e do já citado estacionamento limitado, a ideia que fica é que todo aquele esforço se destina a agradar a outro público que não o nosso. Como eu faço parte de uma 5ª coluna e entregaria ao inimigo todos os segredos do país nos primeiros minutos de invasão por uma potência estrangeira, eu gostei.

    Dados relevantes:

    Distância pedalada: 99 km.
    Altitude máxima: 151 m.
    Velocidade máxima: 53,1 Km/h.

    domingo, 26 de junho de 2011

    Na Ciclovia de Belém

    Lisboa, o Tejo e a bicicleta

    Tinha decidido aproveitar o feriado de quinta feira para fazer um reconhecimento aos novos troços de ciclovias em cima de passeios que a CML achou por bem colocar à nossa disposição. Combinei ir com uns amigos e sendo um deles "recém encartado" no manejo de velocípedes, acabamos por restringir a volta à ciclovia de Belém. Bom, ficou por fazer o tal reconhecimento, mas posso dizer que aprendi bastante com a experiência. Ver este percurso pelos olhos de uma pessoa inexperiente no manejo de uma bicicleta, permite tirar algumas conclusões que de outro modo não passariam de conjecturas.

    Ah, o cycle chic

    Sendo um feriado, a ciclovia de Belém apresentava-se repleta de todos os seus elementos habituais: hordas de turistas, pescadores, crianças, grupos, bicicletas, triciclos, automóveis, contentores de lixo, tudo isto e muito mais se pode encontrar na ciclovia.

    Diz que mede 7 km de extensão, este percurso ziguezaguante e retorcido que une a Torre de Belém a um beco no Cais do Sodré. Será certamente a ciclovia favorita da capital e o seu uso (e quase de certeza o seu intuito) é eminentemente lúdico. O facto de se ser obrigado a desmontar cada meia dúzia de metros e a existência de inúmeros cruzamentos sem qualquer sinalização, não parece preocupar as muitas pessoas que rumam a este percurso em dias de bom tempo. O primeiro problema que se apresenta a um ciclista inexperiente é mesmo esse: desviar-se de todos os outros ciclistas, peões, e obstáculos que povoam a ciclovia. Aqueles que consideram as ciclovias como percursos seguros para os novatos, deveriam ponderar este simples facto: um percurso seguro é um percurso que permita alguma liberdade de movimentos e possibilite que o ciclista se concentre em operar a máquina.

    Ciclovias à moda de Lisboa

    Se o ciclista inexperiente conseguir evitar os turistas parados no meio do caminho a tirar fotografias, os canideos pela trela e os seus orgulhosos donos, os portugas de raça pura, que não sabem o que é uma ciclovia nem querem saber, os atletas de baixo rendimento, os carros que passam na ciclovia para acederem aos seus locais favoritos de estacionamento ilegal, e os Sandokans de fim de semana, sempre a velocidades impossíveis montados nas suas BSO's, terá ainda que lidar com outro tipo de perigo, um perigo que em vez de móvel é fixo, mas ainda assim bastante ameaçador.

    Nunca emprestem a  bicicleta a um bike ninja

    A infraestrutura em si oferece alguns potenciais dilemas aos menos experientes. Ao longo de tão poucos km, o piso desta ciclovia passa de betuminoso para empedrado várias vezes. Boa parte decorre simplesmente em cima do passeio, de calçada portuguesa. Pelo caminho há buracos, buraquinhos e buracões, carris longitudinais, desníveis da altura de um passeio e muitas mais diversões. Uma bicicleta de montanha lida bem com este pavimento, mas outros tipos de velocípedes não estarão nada à vontade.

    Quero, posso e estaciono. Ciclo-quê??

    Apesar de tudo, consegui "desligar" por momentos e simplesmente descontrair. A ritmos muito lentos, sem pressa e sem sítio onde ir, simplesmente desfrutando do Tejo, do Sol e dos amigos, a ciclovia faz sentido. Quem está de passeio não se importa tanto com todos estes problemas técnicos e de segurança. E a ciclovia conseguiu, na minha opinião, atrair mais pessoas para a zona. Como estrutura de lazer, como qualquer parque ou jardim, até funciona. Não será por acaso que a vereação que na CML se ocupa da ciclovias é a dos Jardins e Espaços Públicos e não a dos Transportes.

    Mais uma moedinha, mais uma voltinha

    Mas se os Lisboetas apreciam novos espaços públicos de lazer, não me parece que isto acrescente algo em termos de mobilidade sustentável. Porque a ciclovia de Belém é como um cinema. Ou um ginásio. Vai-se lá de propósito e depois vai-se embora. A maioria não utiliza a bicicleta para chegar a este percurso. A CML tem uma visão muito particular do que pretende das suas "ciclovias".

    sexta-feira, 17 de junho de 2011

    Crónicas do Portugal Profundo: Idanha-a-Nova

    Há dias piores...

    O fim de semana estava devidamente programado, as bicicletas carregadas descansavam no seu lugar próprio a bordo do comboio regional da CP, quase vazio, que tinha como destino Castelo Branco. Tudo rolava sobre carris, por assim dizer, e a expectativa era grande. Pela frente tínhamos, a co-habitante e eu, quatro dias de verdadeiro cicloturismo no Portugal profundo.

    Viajar de Comboio: quase tão bom como de bicicleta!


    Para quebrar a monotonia, já perto do fim da viagem, fui brincar com o GPS, verificar a velocidade do comboio, a distância a que estávamos do destino, a altitude... As paisagens neste percurso são deslumbrantes, muitas vezes avançamos por vales que não se poderiam visitar de outra maneira, o azul dos rios e o verde das florestas enchem as janelas e lentamente começamos a sentir-nos desligados do stress urbano de Lisboa.

    Com um atraso de mais de meia hora, o comboio entra em Castelo Branco perto das 20:30h, criando em nós uma certa ansiedade, uma vez que ainda temos que atravessar a cidade que não conhecemos e chegar ao parque de campismo nos seus arredores, a tempo de montar a tenda antes de escurecer. Para a navegação contamos com o auxilio do GPS, que vem carregado de pontos de interesse e percursos para todos os locais que pretendemos visitar. Com os minutos para o pôr do sol a contar, faço uma descoberta muito embaraçosa: na brincadeira no comboio, inadvertidamente apaguei tudo o que estava na memória do GPS! Os níveis de ansiedade crescem, assumo a responsabilidade perante a co-habitante e não temos outro remédio senão partir e tentar encontrar o caminho recorrendo a meios mais convencionais.

    Na estação da CP de Castelo Branco

    Felizmente a distância não era grande e, como se diz, quem tem boca vai a Roma. Apesar da tensão crescente que sentíamos, a verdade é que a tenda foi montada no bonito parque de campismo municipal com os últimos raios de Sol. O que nos deixou só com mais um problema: no parque não havia qualquer infraestrutura de apoio, teríamos que ir jantar fora. Assim, contra as nossas regras, percorremos cerca de 3 km na estrada escura para jantar num simpático restaurante nos subúrbios de Castelo Branco, perto dos novos supermercados lá da terra. Felizmente tínhamos luzes, embora de recurso.

    Amanhece no parque de campismo de Castelo Branco

    O amanhecer do 2º dia foi duro, já estávamos esquecidos dos rigores do campismo e algo destreinados em desmontar tendas e encher alforges. Tudo re-acondicionado, banhos tomados, pequeno almoço ingerido e indicações para o caminho obtidas, eram quase onze horas quando finalmente nos fizemos à estrada. Era Domingo de manhã, pelo que o trânsito nas estradas nacionais era ligeiro, e cruzámos caminho com vários ciclistas locais, incluindo crianças. Os habituais comprimentos trocados com os colegas do pedal e as paisagens da região mantinham os espíritos em alta, apesar do Sol impiedoso do meio dia obrigar a algumas cautelas. Precavidos, só eu transportava 2 litros de agua e não facilitámos com o protector solar. Pelo caminho encontramos uma estranha "ciclovia", que recordava as de Lisboa: começava no meio do nada e acabava em nenhures.

    Idanha-a-Nova, típica rua, neste caso onde se encontra o Posto de Turismo

    Na maior parte do percurso que fizemos a estrada era estreita e não havia bermas. Valia o fraco fluxo de trânsito. A altimetria era muito acessível, o percurso não era plano, mas ora se subia um bocadinho ora se descia e recuperava o tempo perdido. Já bem entrada a hora de almoço, chegámos a Idanha-a-Nova e dirigi-mo-nos directamente à zona velha, na demanda de um merecido almoço. Isto veio a revelar-se um erro táctico, uma vez que nesta zona só havia um restaurante digno de esse nome, e um de onde não conseguíamos manter vigilância sobre as bicicletas que ficariam na rua, com toda a sua carga. Demos várias voltas mas tivemos que nos resignar às evidências: ou era ali ou teríamos que sair da vila para procurar almoço. Fomos recebidos neste estabelecimento com sorrisos amarelos e alguma desconfiança. Não estávamos de licra, mas mesmo assim a visão de um ciclista a entrar num restaurante ainda perturba algumas pessoas, uma experiência que já tinha de viagens no passado.

    Almoçamos, não deixámos gorjeta e fomos dar um salto ao posto de turismo local, para confirmar o caminho para o parque de campismo e saber mais sobre as maravilhas da região. A saída de Idanha faz-se a descer, numa estrada de curvas retorcidas, onde se atingem velocidades impressionantes. Este troço requereu alguma atenção, mas dentro em breve estávamos de novo numa estrada tranquila e em menos de nada demos com esta vista:

    Albufeira da Barragem Marechal Carmona

    O parque de campismo estava agora a 1500 metros e rapidamente tratámos da inscrição, montámos a tenda, largamos a tralha e fomos fazer um reconhecimento à albufeira. Por ser Domingo havia bastante gente nas margens, a pescar, tomar banho ou só a passear. Todos insistiam em levar o carro mesmo até à beira de agua e havia uns tipos irritantes a fazer barulho e levantar poeira nuns buggies alugados. Mesmo assim conseguimos arranjar um cantinho sossegado só para nós e o nosso merecido descanso.

    Patinhos!

    Caminho que circunda parte da albufeira

    O merecido banho

    Aos poucos, os vai e vem da malta dos todo terrenos começou a acalmar, e as pessoas começaram a desaparecer das margens da albufeira. A temperatura baixara notoriamente e não faltou muito para também nós rumarmos ao parque em busca de jantar. Depressa descobrimos que, ao contrário do prometido na recepção, não havia um restaurante digno de esse nome no parque e o que existia não estava aberto depois das oito. A senhora da recepção conseguia irritar-nos ainda mais, recusando-se a abrir a cancela para passarmos na entrada, obrigando-nos a entrar e sair pelo estreito acesso para peões. Felizmente havia um restaurante a curta distância do parque, onde comemos muito bem.

    Cai a noite na albufeira

    Para o terceiro dia estava pensada uma visita a Idanha-a-Velha, uma aldeia histórica bem conhecida da região. O plano original envolvia seguir um track por estradão até à vila, mas como o track já não existia no nosso GPS, resolvemos seguir um percurso pedestre semelhante, marcado no terreno. O problema dos percursos pedestres é que nem sempre se adaptam ao ciclismo, pois podem ter secções que envolvem escalada, túneis na rocha ou outras dificuldades dificilmente transponíveis de bicicleta, mesmo de todo o terreno, como era o caso. Assim, logo nos primeiro quilómetros fomos confrontados com obstáculos intransponíveis e obrigados a abandonar também este plano B, pelo que acabámos por optar pelo C: ir pela estrada.

    Ops: fim do caminho!

    Aproveitámos o desvio para Sul e fomos dar uma olhada à barragem propriamente dita, que se acede por uma estrada própria. Sendo Segunda Feira, esta zona estava deserta. A obra data dos anos 30 e se não impressiona pela grandiosidade, a sua idade avançada e decoração com tiques Estado Novenses merecem destaque. Existe mesmo um enorme brasão com esfera armilar acoplado ao paredão da barragem. Orgulho de ser português e essas coisas. Outros tempos. Não nos podíamos demorar por ali, o calor apertava e a ideia era estar em Idanha-a-Velha pela hora do almoço. A estrada que tomámos tinha algumas subidas dignas de nota, mas o trânsito era quase inexistente, o que tornou a viagem bem aprazível. Com receio de não encontrar nada em Idanha-a-Velha, comprámos comida na bonita vila de Alcafozes, e seguimos caminho para a aldeia histórica, a poucos quilómetros de distância.

    Idanha-a-Velha, tal como se avista da estrada

    Almoçamos na rua, sentados na ruína da muralha da vila, à sombra de umas árvores e com vista para a igreja de Sta.Maria. Passeámos pela terra, onde me chamaram especialmente a atenção os vestígios da presença romana naquelas paragens. Tudo bem mantido e organizado. Só falta a coragem política, como noutros lugares, para proibir a entrada de automóveis na vila, o que daria mais destaque ao valioso património arquitectónico. Mesmo assim, em termos de recuperação do edificado e valorização dos espaços, tanto para quem visita como para quem lá mora, Idanha-a-Velha bem podia ser um exemplo para incontáveis aldeias deste país.

    Vista de Idanha-a-Velha, Igreja de Sta. Maria em destaque

    A ponte Romana. Quantas pontes feitas hoje durarão 2000 anos?

    O passeio chegou ao fim depressa demais, mas tínhamos alguma preocupação com o sítio onde iríamos jantar, uma vez que o restaurante do dia anterior estaria fechado e o parque de campismo tinha uma espécie de café que fechava às 20h. Ir a Idanha-a-Nova comer era possível, mas pouco recomendável, (distância/altitude) pelo que teríamos que regressar cedo ao parque e estudar uma solução.

    As pedras estavam soltas e tanto a co-habitante como eu molhamos o pezinho!

    O regresso fez-se pelas mesmas estradas tranquilas, depois de encontrarmos um atalho para a saída da vila que poupou alguns quilómetros às nossas pernas. Não fosse um automobilista idiota, daqueles que buzinam e fazem razias sem qualquer necessidade e o regresso teria sido perfeito. Chegamos tão cedo que ainda fomos tomar qualquer coisa e espreguiçar para a piscina do parque, quase deserta. Compramos umas sandes para o jantar antes do fecho do café e ainda fomos dar um passeio a pé pela zona, antes de ir para a cama.

    Nacional 332 à saída de Idanha-a-Velha, uma estrada típica da região

    A manhã de Terça feira estava destinada ao regresso, e isso implicou levantar cedo. Apesar de alguns atrasos, pelas 09:30 já tínhamos tudo tratado e estávamos na estrada para Castelo Branco. A primeira dificuldade a vencer foi a épica subida para Idanha-a-Nova, um esforço digno de nota (e de medalha!) para bicicletas carregadas e ciclistas abaixo de forma. Apesar de tudo, a dificuldade foi superada sem grandes problemas. Daí para a frente o trânsito foi aumentando à medida que nos aproximávamos de Castelo Branco, tornando-se mesmo perigoso já perto do destino, com ultrapassagens "à queima" constantes, por parte de ligeiros e pesados, na estrada sem bermas. Sobrevivemos, e almoçamos calmamente perto da estação, enquanto esperávamos que a bilheteira da CP abrisse.

    O Comboio para o Entroncamento, onde outro idêntico nos levaria a Lisboa

    O setup habitual nestas viagens

    A viagem decorreu com tranquilidade, como diria o Paulo Bento, apenas tivemos o choque de regressar a Lisboa e à realidade nua e crua da hora de ponta da capital. Chegámos a casa já com saudades do ar puro e do sossego de um distrito que tem uma das menores densidades de população do país. E muito mais que isso para oferecer ao viajante de bicicleta.

    Dados relevantes do fim de semana prolongado:

    Distância pedalada: 170 km.
    Altitude máxima: 403 m.
    Velocidade máxima: 60,7 Km/h.
     
    1º dia: Casa - Stª Apolónia e CP - Camp. Castelo Branco. Total 24,7 Km
    2º dia: Camp. Castelo Branco - Camp. Idanha a Nova. Total 50,1 km
    3º dia: Camp. Idanha - Idanha a Velha e regresso. Total 45,3 Km
    4º dia: Camp. Idanha a Nova - CP Castelo Branco - Casa. Total 49,9 Km

    O Império Contra Ataca

    Imagem de promoção do evento

    Há uma enorme agitação mediática em torno do evento na Av. da Liberdade deste fim de semana. O famoso "Mega Pic Nic", que se destina a promover produtos agrícolas portugueses, atraiu a ira de várias entidades devido aos cortes significativos na circulação automóvel. O ACP, pela voz do ReichFüher Barbosa, já fez saber que "a CML não quer saber dos lisboetas para nada", insistindo assim na sua ideia retorcida de que toda a gente se desloca sempre de carro e logo todos serão prejudicados por não poderem levar a vaca sagrada para a avenida mais poluída da Europa.

    Pelo seu lado, a associação dos fogareiros, está a fazer uma birra tremenda porque a Carris vai operar naquela área mas eles não serão autorizados a passar, pelo que ameaça bloquear fisicamente o evento!

    Quem vir o Reichfüher Barbosa ou o tipo da ANTRAL a falar na televisão, absolutamente indignados, diria que se tratava de tortura ou violação dos direitos humanos e não de limitações de circulação numa rua. Esta gente está tão cheia de razão, tão cheia de "direitos", que torna um pouco mais claro como é tão difícil conseguir alguma coisa no sentido de uma mobilidade mais sustentável na capital. Este é o rosto do inimigo, tem cobertura mediática permanente e defende cada palmo do "seu" asfalto, com unhas e dentes.

    Não deixa de ser irónico que quando um troço ainda maior da Av. da Liberdade foi também encerrado para um espectáculo grotesco de Formula 1, não há muito tempo, não se ouviram protestos. Tal como não se ouvirão este fim de semana no centro do Porto, onde, suprema ironia, corridas de carros paralisam a cidade. Assim estão as coisas no país dos popós.

    quarta-feira, 15 de junho de 2011

    A Vasta Minoria

    Vasta Minoria

    Assim intitula o Público um pequeno artigo e um vídeo sobre o uso da bicicleta como meio de transporte na cidade de Lisboa. Gostei da expressão, gostei do vídeo, de qualidade acima da média para este tipo de coisa. Vale a pena dar uma olhada.

    sexta-feira, 10 de junho de 2011

    Fui...



     ...Dar uma volta. Quem me dera que fosse um "Fui" mais sério, mais definitivo. Ia para Amesterdão e deixava a dívida para os que ficam. Mas não, vou só desaparecer por uns dias, aproveitar para rolar um pouco com a minha BUS, à qual fiz recentemente mais uns upgrades: Pneus, punhos e guarda-lamas.

    Pneus: Troquei os sliks de estrada pelos pneus de cidade "standard", uns Schwalbe Marathon, na medida generosa de 2.0, quase parecem de BTT (e quase dão para fazer BTT também!). Posso ter perdido em capacidade de rolamento, mas não noto nada. A aderência sim, mudou muito e para melhor. As bandas reflectoras também ajudam quem, como eu, circula não poucas vezes de noite.

    Punhos: As BTT com ares de competição costumam vir com punhos de borracha muito finos e sem ergonomia nenhuma. São bons para agarrar o guiador com toda a força e pouco mais. Ora como a minha BTT/BUS tem agora a tarefa de dar mais algum conforto que aquele que se pode exigir nos domingos de manhã na serra de Sintra, arranjei uns de modelo mais confortável, com mais borracha e melhor ergonomia.

    Guarda Lamas: Imprescindíveis para um uso urbano diário, mesmo sem ser no Inverno. Acontece que as BTT's recentes já poucos ou nenhuns apoios têm para este tipo de acessórios, pelo que acabei por só conseguir montar os meus SKS de tamanho XXL atrás (a contar com uma aplicação futura de pneus Big Apple). Tenho que arranjar uma solução para a frente.

    Para rematar, coloquei uma luz fixa na grelha traseira, com reflector incorporado. É a pilhas, mas ao menos não me esqueço dela. Todo este kit de equipamento já foi bem testado e vai ser agora posto à prova num fim de semana de trekking prolongado, no Portugal profundo.

    Adeus, até ao meu regresso.   

    segunda-feira, 6 de junho de 2011

    Fui votar. E agora?

    Desmonte. Pare, escute e olhe. Muitas vezes.

    Sim, fui votar. De bicicleta, claro. Mesmo não vendo nada de novo nos programas eleitorais dos partidos. Mesmo não vendo minimamente representadas as minhas preocupações relacionadas com o uso utilitário da bicicleta em nenhum desses programas.

    Eu sou sócio da FPCUB e do MUBI. Mantenho-me informado. Utilizo quotidianamente a bicicleta e falo amiúde desse assunto a quem por ele mostra curiosidade. E mantenho um blogue, este, onde expresso opiniões e falo das minhas experiências. Nos últimos tempos tenho assistido a um crescente interesse pela mobilidade sustentável e pelo ciclismo utilitário em geral. Sucedem-se novos blogues, novos projectos, artigos na imprensa, novas iniciativas mobilizadoras, até algum novo empreendedorismo nesta área. Mais importante que tudo isso, tenho visto mais bicicletas em Lisboa, penso que é um facto indiscutível.

    E afinal como estamos? Quantos somos? Que peso temos ou podemos esperar ter? A acreditar nos dados de um estudo Britânico mencionado nas discussões do MUBI, e estabelecendo livremente paralelos (forçosamente pouco rigorosos) com o nosso pequeno rectângulo ibérico, seremos muito poucos e estaremos ainda por muito tempo subjugados às vontades de uma maioria que nem sequer considera a bicicleta como um veículo. Esta maioria não quer partilhar o espaço rodoviário com o ciclista nem está de acordo em que se gastem fundos, cada vez mais escassos, em novas estruturas segregadas, as tão discutidas ciclovias.

    Não é Lisboa. Mas podia ser.

    A vitória eleitoral de um partido onde a palavra "bicicleta" nem sequer aparece em nenhum ponto do seu programa, e a actual conjuntura económica extremamente negativa, que monopoliza todas as atenções, parecem conjugar-se para manter o actual estado de coisas, no que toca às questões que considero essenciais para o desenvolvimento do ciclismo utilitário:

    • Reforma do código da estrada, incluindo a introdução de regras de Strict Liability. (Poder central)

    • Construção de infraestruturas cicláveis segregadas e implementação de programas de bicicletas partilhadas. (Poder local)

    Já sei que estes pontos estão longe de ser consensuais e muita gente está disposta a contentar-se com muito menos. Eu não abdico de exigir um país mais justo, onde uma pessoa se possa deslocar sem poluir, sem gastar combustíveis fosseis, sem provocar engarrafamentos, sem que disso resulte um perigo constante para a sua vida e integridade física. Por isso considero estes pontos essenciais. As eleições legislativas trouxeram-nos oportunidades de atingir estes objectivos? Ou alguma coisa de novo sequer? Não sei. A reforma do código da estrada não parece estar nos planos do grande vencedor, o PSD, embora o CDS, que se presume também fará parte do novo governo da nação, mencione o assunto no seu programa.

    Ideias novas precisam-se. Ir votar obviamente não chega.