sexta-feira, 30 de julho de 2010

Bicicletas de aluguer

Fotos: Pedro Monteiro
 
Enquanto a tão falada rede de bicicletas de uso partilhado de Lisboa continua no limbo, arranca hoje em Londres um projecto semelhante, que se junta a muitos outros já existentes em várias cidades europeias. De notar que Londres, embora não possuísse este sistema de aluguer de bicicletas de curta duração, tem uma vasta tradição do uso da bicicleta para fins utilitários, sendo muitas as pessoas que se deslocam diariamente para o trabalho a força do pedal, entre elas o próprio Mayor, Boris Johnson.


Veremos algo semelhante em Lisboa?

 
As bicicletas de uso partilhado são uma grande ideia e uma ideia que funciona, como pude comprovar pessoalmente em Barcelona o ano passado. Uma amiga minha, de férias em Paris forneceu a foto que abre este post, pois essa capital europeia também possui um sistema público de aluguer de bicicletas. Infelizmente em Lisboa, muita gente vê este sistema como uma brincadeira para meia dúzia de turistas, onde a câmara irá simplesmente perder dinheiro. A doentia obsessão lisboeta pelo automóvel não permite a muitos sequer considerar outras opções, mais válidas e práticas.

A mim só me resta perguntar, para quando senhor Costa?

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O reconhecimento do reconhecimento do reconhecimento

É por aqui? Não vejo nada!


Há uns meses deixei-me convencer a participar nas míticas 24h de BTT. Este ano o evento decorrerá nos terrenos do Complexo desportivo do Jamor, ou no "estádio", para os amigos. Provas competitivas caras e levadas demasiado a sério não são bem o meu cup of tea, mas pela companhia e o desafio de pedalar de noite, acabei por aceitar inscrever-me, com tudo o que isso implicava. E implica o quê exactamente? Bom, além de estar minimamente em forma, uma vez que qualquer percurso delineado no estádio será bastante técnico, com muita subida e descida constante, havia que arranjar umas boas (e caras) luzes e ganhar alguma experiência a pedalar no escuro, uma vez que pedalar de noite é uma das características da prova.

Ontem lá fui para mais uma sessão de pedaladas no escuro. Já tinha ido a um passeio de reconhecimento com os organizadores e a umas voltas de "treino" diurnas com amigos. Mas de noite é sempre diferente. Primeiro há que esperar bastante para que anoiteça, o pôr do Sol estava previsto para as 20:53. Depois, tudo fica um pouco diferente, as pessoas desaparecem, os trilhos têm de ser percorridos a velocidades muito mais reduzidas, porque, mesmo com boa iluminação, nunca se vê grande coisa. É sempre uma aventura.

A meio do caminho fomos interpelados por uns indivíduos com ar desconfiado, que queriam saber o que estávamos ali a fazer. (Err, em cima de uma bicicleta, vestidos com roupa de ciclismo, com luvas de ciclismo e sapatos de ciclismo, com capacetes de ciclismo, a percorrer um trilho... se calhar estávamos, sei lá, a andar de bicicleta??!) Aparentemente os senhores estavam preocupados com a segurança de equipamentos de obras, que decorrem no Estádio propriamente dito.

Tirando este breve encontro, não vimos mais pessoas nos trilhos. Só coelhos, dúzias deles, com os olhos vermelhos, a fugir à frente das nossas luzes. A nossa volta levou-nos a todos os recantos do complexo e terminou na pista de corta mato, onde há muita areia solta, que torna pedalar à noite uma missão quase impossível.

Quando abandonámos a zona do Jamor, eram quase onze da noite. Infelizmente tinha ficado claro que precisávamos de treinar muito mais!

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Lisboa - São Torpes, dia 5: Uma história de duas cidades

GPS mostra o total de km percorridos até ao Outão: 324

Amanhece na Arrábida e é chegada a hora de regressar a casa. Na noite anterior, à frente de uma valente dose de choco frito, tínhamos acordado terminar a viagem recorrendo aos transportes públicos. Assim, descemos do Outão para Setúbal e atravessámos a cidade até à estação da Fertagus.

Pedalar em Setúbal não é especialmente complicado, as ruas são largas e o trânsito não é tão rápido ou agressivo como na capital. Quase me senti seguro no percurso que fizemos. Já a estação tem amplos elevadores para as plataformas e o simpático funcionário da bilheteira foi prestável e não levantou qualquer problema em relação às bicicletas. Quase todos os transportes públicos portugueses apresentam hoje em dia alguma alternativa que permita o transporte de bicicletas, o problema é que existem muitas excepções, restrições e ambiguidades e por vezes não temos a certeza do que iremos encontrar. Neste caso, 5 estrelas para a Fertagus.



A nossas montadas têm lugar especifico no comboio da ponte

O comboio começa com pouca gente em Setúbal e vai gradualmente enchendo à medida que nos aproximamos de Almada e de Lisboa. Alguns passageiros têm um certo ar rufia e deambulam para trás e para a frente na composição, fazendo recordar  comportamentos que conheço da linha de cascais, de quem procura evitar o revisor e fazer a viagem de borla. Não demora muito até duas moças serem apanhadas sem bilhete e multadas, mesmo à nossa frente. Curiosamente, parecem indiferentes à situação e depressa percebemos porquê: não são expulsas do comboio, seguem o resto da viagem agora tranquilamente sentadas e decerto não têm intenções de pagar a multa.


Não resistimos a dar uma de turistas

Saímos em Sete Rios, com a ideia de apanhar a linha de Metro directa para o Cais do Sodré. Infelizmente, depois de subirmos e descermos vários lanços de escadas com 30 kg de bicicleta às costas, somos interpelados por funcionários do Metro e informados, diria que com firmeza desnecessária, que não podemos levar as bicicletas no metro antes das 20:00h. Estamos mais perto da hora do almoço do que da do jantar, pelo que nos vemos obrigados a atravessar Lisboa à força do pedal.

Sete Rios, Praça de Espanha, António Augusto de Aguiar, Fontes Pereira de Melo, Av. da Liberdade, Restauradores, Rossio, Baixa, alguns km e muitos taxistas kamikaze depois, estamos na ciclovia para Belém. Infelizmente, para além do traçado labiríntico, as inúmeras zonas mistas para peões, o piso deplorável, os cruzamentos sem prioridade ou sem informação alguma sobre quem detém a prioridade, a ciclovia começa a ser invadida pelo famoso vírus residente de Lisboa: o pópó.


Carros na ciclovia



Piso irregular, carris, obras e caixotes do lixo na ciclovia


Ciclovia? Qual ciclovia? Isto aqui é um estacionamento!


Chegámos a Algés já sem vontade para confusões. Apanhamos o comboio para Oeiras e em poucos minutos estamos em casa. Depois de um total de 339 km pedalados, o regresso a uma rotina mais normal não é tão simples como parece. De repente já não temos que nos preocupar com uma data de coisas, como transportar água suficiente, montar a tenda antes do anoitecer, deixar a toalha a secar antes de ir dormir... Que estranho! Estes escassos 5 dias de viagem pareceram muitos mais, foi uma experiência intensa, sem dúvida a repetir.


Track GPS do percurso que fizemos disponível aqui.


Percurso carregado no site www.gpsies.com


Dados do dia:

Km totais: 24 (pedalados!)
Velocidade média: 14,40 km/h
Velocidade máxima: 47,2 km/h
Água consumida: 1 L/pessoa

terça-feira, 27 de julho de 2010

Lisboa - São Torpes, dia 4: O regresso

Se os exércitos marcham sobre o estômago, o cicloturista marcha sobre água. No verão, muitos litros de água! Por isso, tivemos o cuidado, como sempre,  de comprar água antes de partirmos de São Torpes, para a jornada que nos deveria levar de regresso a Setúbal.


Trilho arenoso paralelo à estrada.

Graças a indicações conseguidas na recepção do parque, poupámos alguns km de asfalto à saída de São Torpes, utilizando um atalho que segue para as praias. Depois foi rumar a norte, pelas mesmas estradas que nos tinham trazido até aqui. Rolámos tentando manter um ritmo vivo, que nos permitisse chegar a Tróia ao inicio da tarde. Ainda ensaiamos apanhar um trilho paralelo à estrada R 261, tal era a monotonia e as saudades do todo-o-terreno, mas este revelou-se demasiado arenoso e só ocasionalmente ciclável.

Sempre a rolar bem, chegámos a Melides com a fome a apertar, e decidimos aconchegar o estômago nesta simpática vila alentejana. Não nos arrependemos, e depois de esclarecer um punhado de espanhóis sobre o melhor caminho a tomar para Lisboa, rumámos também nós a norte.


Parte do nosso stock de água

É um pouco monótono pedalar pelas estradas semi-rectas alentejanas, mas de vez em quando essa monotonia é quebrada. Seja pelo "Zé do volante" que atira o carro para cima de nós e buzina no mesmo instante em que nos ultrapassa a muitos km/h, na esperança sádica de nos ver cair, ou então, por exemplo, ao presenciar, uma discussão conjugal. Esse último caso surpreendeu-nos depois de Melides, numa bomba de gasolina, onde um homem e uma mulher disputavam energicamente o duvidoso privilegio de conduzir um Fiat Punto. O homem levava alguma vantagem, tinha conseguido tomar o lugar do condutor, mas a mulher torcia-lhe um dos braços atrás das costas, sem piedade, enquanto o golpeava na cabeça, indiferente aos seus protestos e queixumes. Decidimos não parar.


Quase em Tróia

Rolámos bem até chegar à península de Tróia, onde um vento frontal ameaçava frustrar os nossos esforços. Com um ritmo bem mais modesto, seguimos pela estrada até, pouco depois da Comporta, a Marta não poder mais. Estava estoirada, em hiper-ventilação. Foi necessária uma boa meia hora, sentada, na sombra, para ela conseguir retomar o selim.

A grande "K" no ferry.


A travessia do ferry ficou desta vez bem mais cara, ao preço de 4,5 Eur por cabeça. Nada que nos tirasse o sono, tínhamos conseguido chegar e uma vez em Setúbal, segundo o GPS, estaríamos a 8 km do parque de Campismo!

Esse percurso não se revelou tão fácil assim, uma vez que o parque de destino era o do Outão, o que implicava tomar a estrada para a Arrábida, com as suas muitas subidas e curvas retorcidas. Mesmo a chegar, ia sendo albarroado por um Mercedes, cujo condutor achou por bem passar um sinal de stop olhando só para um dos lados... 


Os empreendimentos de Tróia vistos do Outão.


Dados do dia:

Km totais: 83
Velocidade média: 15,40 km/h
Velocidade máxima: 44,5 km/h
Água consumida: 3 L/pessoa

Lisboa - São Torpes, dia 3: Descanso, estrada e mais bitoques

Praia da Galé




O parque de campismo da Galé é uma preciosidade do litoral alentejano. O espaço, as instalações, a organização, e, mais importante, a simpatia do pessoal, fazem deste parque um oásis de descanso e lazer na costa alentejana. Com uma das mais maravilhosas praias do país a servir de moldura, foi neste cenário que nos demoramos mais ao longo da viagem. Optamos por passar a manhã no parque, a tratar das pequenas tarefas que não podíamos mais adiar, como lavar e secar a roupa, limpar e verificar as bicicletas e tratar de algumas afinações. Os mais de 160 km que tínhamos feito até aqui deixaram marcas, não só no corpo, mas também no equipamento.


As nossas fiéis montadas aguardam o duche

Tenho noção que há quem faça 160 km de bicicleta num só dia, talvez antes de ir a casa almoçar, mas nós somos só duas pessoas normais, sem especial preparação física, e utilizamos duas bicicletas de BTT também perfeitamente "normais". A Decathlon da Marta, por exemplo, custou pouco mais de 200 Euros e já fez milhares de quilómetros. Com alguns cuidados, de certeza fará muitos mais.


Realizadas as tarefas, almoçamos no parque e partimos para uma pequena etapa rumo à vizinha cidade de Sines, onde planeávamos pernoitar. Em pouco tempo percorremos os cerca de 40 km de estrada, maioritariamente com berma e chegamos ao centro de Sines. Pelo caminho ainda nos cruzamos com vários outros ciclistas locais, que utilizavam a bicicleta para se deslocarem às praias da região.


A R 261-5 mais parece uma auto-estrada!

Em Sines parecia que já saboreava o peixe grelhado que ia comer ao jantar, mais ainda depois de ter descoberto uma espécie de feira de tasquinhas com comida regional. Tínhamos feito poucos km, íamos comer bem, tínhamos as bicicletas revistas e a roupa lavada, as coisas começavam-se a compor.

Esse "feeling" infelizmente durou pouco. Fomos escorraçados das tasquinhas por uma senhora diligente que parecia não gostar de bicicletas. Depois de uma subida íngreme, obstáculo que começávamos a considerar universal para chegar a todos os parques de campismo, fomos encontrar o dito... fechado! Tivéramos atempadamente o cuidado de ligar para todos os possíveis locais de dormida, a confirmar que estavam abertos, aceitavam seres humanos sem carta de campista e não estavam cheios. Alguma coisa tinha falhado.

Em Sines, mas não por muito tempo.


O cartaz não deixa margem para dúvidas.

Para um cicloturista, ser apanhado desprevenido numa situação destas é extremamente desagradável. Por sorte, nesta zona do país abundam os parques de campismo, ainda não era muito tarde e nós conservávamos energias suficientes para pedalar até Milfontes, se necessário fosse.

Voltámos à estrada e rumamos um pouco mais a Sul. Perdemos algum tempo à procura do Parque de Campismo de São Torpes, o mais próximo. Foi penoso pedalar nas estradas da região, por causa do vento que se levantou ao final do dia, mas sobretudo por causa do trânsito denso que havia na zona e o habitual comportamento execrável do "Zé do Volante" português, que não abranda, não dá espaço, e força a ultrapassagem mesmo que leve o guiador pela frente. Para completar o cenário, quando finalmente chegámos ao parque, constatámos que a zona de tendas era uma espécie de baldio, com lixo e carros espalhados um pouco por todo o lado, numa mistura de estacionamento ilegal com campo de refugiados. As diferenças para o parque da Galé, apenas a 60 km de distância, não podiam ser mais gritantes.


A zona de São Torpes é linda, os condutores nem tanto.

Resignados à nossa sorte, apressámo-nos a montar a tenda e tomar banho, para chegar a horas decentes ao restaurante. Este estabelecimento estava em sintonia com o resto do parque, um homem sozinho atarefava-se a servir à esplanada, fornecer jantares no interior e cafezinhos e licores ao balcão. Algumas horas depois conseguimos comer um bitoque gorduroso, servido sem arroz e sem salada, tal como tinha aliás acontecido na primeira noite em Sesimbra. E já não foi mau.

Dados do dia:

Km totais: 68
Velocidade média: 16,76 km/h
Velocidade máxima: 41,4 km/h
Água consumida: 1,5 L/pessoa

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Lisboa - São Torpes, dia 2: Também te doi aqui?

No Parque de Campismo Municipal de Sesimbra


A manhã do segundo dia de viagem foi a mais complicada. Acordámos ambos com dores musculares e uma sensação de cansaço generalizada. Eu dormi mesmo bastante mal, tendo passado boa parte da noite a espirrar. Tinha as minhas dúvidas quanto a conseguir sequer sair da cidade, quanto mais completar a etapa, que se previa a mais longa da viagem.

Ainda assim, tomamos o pequeno almoço, comprámos água, arrumamos as nossas tralhas e estávamos prontos para partir a uma hora respeitável. Cruzamos a zona do porto e depressa chegámos à primeira subida (é impossível sair de Sesimbra sem subir bastante!). A Marta olhou para a estrada inclinada e desmontou. Subimos a pé.

Castelo de Sesimbra
Chegados à zona onde o track nos deveria levar por um trilho até ao castelo de Sesimbra, fui eu que recomendei que fossemos pela estrada, tínhamos um longo caminho pela frente e nenhum de nós estava capaz de andar a subir morros, para visitas turísticas. Acabámos assim por evitar alguns pontos interessantes, mas que teriam acrescentado muitos km ao percurso, como seria o caso do Castelo de Setúbal.

Já fora da cidade, rumamos à pedreira e trilhos envolventes. Foi uma zona muito agradável de explorar, rolávamos bem, apesar do terreno pedregoso e vegetação fechada, onde por vezes só passávamos depois de muito raspar os alforges. Longe dos carros e da confusão urbana anda-se muito melhor, essa é uma das maravilhas do BTT.


Marta procura respostas no GPS
Avançando por trilhos e pequenos troços de ligação em estrada, parecia não estarmos a chegar a lugar nenhum e era já hora de almoço. Estava a ficar tarde não só para almoçar, como para chegar a Setúbal, apanhar o ferry para Tróia e ainda pedalar até algum lado antes do fim do dia (e das nossas forças). Com isto em mente, fizemos novo desvio do percurso previsto e apanhamos, um pouco por acaso, a N10, para Setúbal. Esta estrada é das poucas com uma berma civilizada que encontramos nesta viagem, além de outras boas características, pelo que rodávamos mais descansados e a bom ritmo. Tanta sorte tivemos neste itinerário que encontramos um restaurante na beira da estrada, onde almoçamos maravilhosamente e voltamos a arrancar com mais animo e já convictos que chegaríamos a bom porto ainda a horas decentes.

A caminho de Tróia
Em Setúbal descobrimos uma cidade renovada, com a Av. Luísa Todi muito apresentável, com os seus passeios novos, e na zona do Porto também registámos melhoras dignas de nota. Mas a nossa prioridade era mesmo o ferry, que apanhamos por preços de saldo, uma vez que estávamos psicologicamente preparados para pagar 4,5 Eur / pessoa pela travessia e pagámos apenas 2.

Concluída a travessia, começamos de imediato a rolar a boa velocidade rumo ao Sul. Sem grandes percalços, num par de horas estávamos no estradão que dá acesso à praia e parque de campismo da Galé, rumo a uma refeição quente e uma merecida boa noite de sono.


Dados do dia:

Km totais: 80
Velocidade média: 14,76 km/h
Velocidade máxima: 57,3 km/h
Água consumida: 4 L/pessoa

domingo, 25 de julho de 2010

Lisboa - São Torpes, dia 1: O Bom, o Mau e o Muito Estranho

Saio da cama com os primeiros raios de sol, consciente que aquele não será um dia qualquer. As bicicletas, carregadas com tudo o que vamos necessitar nos próximos tempos, aguardam na sala. Depois de quase uma semana de preparativos, está tudo a postos para começar as planeadas mini-férias pelo litoral alentejano.

A Marta, companheira de esta e outras aventuras, e eu, entramos na marginal sentindo uma certa ansiedade. O derradeiro teste à resistência das grades porta-bagagens e alforges que carregamos começa agora. Não estamos acostumados a estes equipamentos, nem a transportar tanto peso. A minha bicicleta ultrapassa mesmo os 30 kg. E se o material aguentar, aguentaremos nós? Só há uma maneira de saber.

Surgem os primeiros carros na estrada, e com eles as habituais demonstrações de falta de civismo. Muitos passam a escassos centímetros dos guiadores, a velocidades bem acima do permitido (ou do dobro do permitido). À conta destes mimos, na Cruz Quebrada tomámos o "passeio marítimo", na realidade uma via de manutenção da REFER que na prática é utilizada como tal. Daí seguimos para Algés e depois Belém, onde apanhámos o cacilheiro para a outra margem.

Ciclovia em Belém, a caminho do Cacilheiro

Esta primeira etapa deverá eventualmente levar-nos a Sesimbra, seguindo percursos fora de estrada sempre que possível, utilizando para o efeito tracks de GPS que seleccionámos na net.

Da Trafaria à Costa aproveitámos a excelente ciclovia, até nos embrenharmos nas trilhos de acessos rurais que nos transportam ao longo das terras entre a arriba fóssil e o mar. Pelo caminho, num trilho onde é proibida a circulação de veículos motorizados, somos surpreendidos por um artista numa mota, que se entretém a destruir as dunas e quase me derruba propositadamente ao passar por nós a todo o gás. Para complementar o cenário, surge a seguir a zona da Fonte da Telha. Dá pena ver aquela paisagem arruinada pelas casas ilegais e todo o lixo e detritos que as rodeiam. Regressámos brevemente à estrada, mediante uma subida intimidante, para seguir caminho para a Lagoa de Albufeira.

Depois de em poucos km termos presenciado inúmeras ilegalidades, eis que somos obrigados a cometer nós uma: o track que seguimos indica um trilho que está atrás de uma cancela fechada. Se seguimos em frente podemos perder-nos, se saltamos a cancela e entramos no pinhal, estaremos a fazê-lo contra a vontade dos proprietários. Acabámos por entrar, o pinhal é uma zona de exploração florestal e nós não temos por hábito danificar nada nem deixar lixo para trás.

Alguns km mais à frente paramos para dar passagem no trilho a uma enorme tractor que puxa um atrelado com troncos cortados. Observamos a perícia com que o condutor consegue ganhar tracção numa subida de piso mole de areia, para segundos depois ficarmos boquiabertos ao verificar que o hábil operador da monstruosa máquina é uma criança de oito anos!

Ainda não refeitos desta visão, uns km mais à frente, já tendo contornado parte da Lagoa, surge perante nós uma espécie de cidade de tendas, com muito lixo à mistura. Podia ser um campo de refugiados, mas mesmo vendo pouca televisão penso que teria ouvido falar da existência de tal coisa. Tardámos um pouco em perceber que tínhamos simplesmente chegado ao Super Bock - Super Rock.

Super Bock - Super Rock, Super Pó, Super Lixo...

A partir daqui as coisas ficaram mais complicadas. Apanhámos muita areia e passámos grandes bocados a empurrar as bikes. Fizemos um pedaço de estrada e voltámos à areia. O trilho acabou por ir dar à praia do Meco, ao areal mesmo, que tivemos de atravessar. Foi na zona do Meco que almoçámos, antes de seguir caminho para o Cabo Espichel. O percurso foi ficando mais e mais difícil, até que demos por nós nas imediações do Santuário mas sem conseguirmos encontrar caminho para lá chegar. O track que seguíamos já teria um ano e durante o Inverno aquela zona terá ficado muito diferente, fruto das intensas chuvas. Perdemos literalmente horas às voltas, a içar as bicicletas de dentro de enormes crateras, sem encontrar a saída. Acabamos por recuar e ignorar o GPS, seguindo na direcção da estrada.

Perdidos no Cabo Espichel

Uma vez na estrada, já de lá não saímos. Estava a ficar tarde e estávamos demasiado cansados. Umas bebidas frescas servidas por uma senhora simpática na Azóia deram-nos as forças e ânimo para prosseguimos caminho. Chegámos ao parque de Campismo, que se acede depois de uma subida demasiado íngreme para viajantes cansados, pelas 17:40, praticamente 11 horas depois de termos começado.


Sesimbra à vista!


Dados do dia:

Km totais: 82
Velocidade média: 12,89 km/h
Velocidade máxima: 56,1 km/h
Água consumida: +4 L/pessoa

sábado, 24 de julho de 2010

Sábado no shopping

Pequeno problema. Recém chegado de uma viagem de 300 km pelo litoral Alentejano, que hei-de partilhar nestas páginas, estava a relaxar em casa quando surgiu um convite para um cafezinho no Oeiras Parque. Embora pense eventualmente mudar-me para Lisboa, para melhor usufruir das infraestruturas (ciclovias!) que finalmente estão a nascer por lá, resido actualmente em Carcavelos, e portanto estou a um pulo do dito templo do consumo.

Acontece porém que a minha namorada tinha saído com o carro e levado consigo o único comando / chave da garagem que temos. Assim sendo, estava impossibilitado de aceder ao meu veículo motorizado, a minha LML. Sobrava claro a bicicleta, já limpa e aliviada da carga das suas lides alentejanas. Detesto pedalar nas desumanas vias rápidas que constituem os acessos à maior parte dos centros comerciais e supermercados modernos. O Oeiras Parque não é excepção. Está bem servido de acessos para automóveis, o resto aparentemente não interessa. Mas sem outras opções e talvez já com saudades do selim, fiz-me à estrada.

A distância é relativamente curta, mas não há como fugir ao facto do centro estar instalado no alto de um monte. Muito calor, estradas sem berma, e cerca de 6 km depois já lá estava. Tive de tomar alguns atalhos, para os quais a minha Kona de BTT é bastante indicada. Levei correntes e prendi a bicla o melhor que pude e a verdade é que no regresso ainda lá estava, inteira. Para primeira experiência de ciclismo utilitário suburbano, nem correu mal.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Do que se trata

Bem vindo ao primeiro post do meu novo blogue! Depois de muitas aventuras nas duas rodas com motor, estou por fim decidido a vencer a dependência da nhãnhã de dinossauro que importamos de paragens longínquas e tentar viver o dia a dia com a ajuda do veículo que mais me fascina, a bicicleta. Aqui encontrará relatos de viagens, pequenas e grandes, movidas sempre a força de pedal e apresentadas numa perspectiva mais utilitária e menos desportiva. As questões de mobilidade urbana e segurança do ciclista estarão também na ordem do dia. Até já!