terça-feira, 30 de agosto de 2011

Vilamoura & Velocípedes

Pôr do Sol na praia da marina

Este ano regressei a Vilamoura, a sui generis localidade algarvia que é ao mesmo tempo uma cidade e um resort privado. Não que as diferenças entre Vilamoura e outras áreas turísticas do Sul de Portugal sejam imediatamente evidentes, afinal Vilamoura também sofre de algum excesso de betão e está infestada de enlatados durante os meses de calor. Mas há algumas características para lá do estatuto jurídico e a temperatura da água que tornam esta terra interessante para mim.

Vilamoura: terra de sonhos, mega-iates e... bicicletas!

Já o ano passado aqui tinha dado conta da utilização utilitária da bicicleta em Vilamoura. Tudo indica que ela é muito superior ao de outras localidades lusas de características semelhantes (se é que existe alguma cidade portuguesa semelhante a Vilamoura...). As pessoas vão ao supermercado de bicicleta, vão à praia de bicicleta. Locais de estacionamentos para bicicletas são comuns. Pistas próprias para velocípedes também abundam. É normal as casas de férias de Vilamoura terem bicicletas na garagem ou arrecadação. Em Vilamoura, a bicicleta não é tabu, e não é um brinquedo. Embora se possa considerar que as bicicletas servem apenas durante o tempo de lazer (as férias), não são utilizadas para fazer BTT ou "treinos" de estrada.

A minha bicicleta urbana emprestada

Na sua maioria as bicicletas são utilizadas para deslocações e os modelos mais populares são bicicletas de montanha baratas, provistas de uma grelha traseira para bagagens ou modelos utilitários puros, como bicicletas de cidade. Há de tudo, menos modelos exóticos de crabono, pelo menos estacionados nas ruas. Para luxos há Ferraris e Bentleys com fartura, sobretudo na zona da marina. É com estes automóveis e muitos outros bem mais proletários que o ciclista utilitário de Vilamoura tem de interagir. Sim, porque apesar da influencia estrangeira, em Vilamoura o panorama automóvel é bem português: o excesso de velocidade, as manobras à campeão, e o estacionamento selvagem estão na ordem do dia, como em muitas outras zonas urbanas do país.

Popós na estrada, popós no passeio... e o povo , pá?

O tráfego durante o mês de Agosto é muito volumoso e os engarrafamentos são tão vulgares em Vilamoura como na área metropolitana de Lisboa. Tudo isso são ainda mais razões para se usar a bicicleta. Não sei se conscientes deste facto, as autoridades do resort têm promovido o uso das duas rodas sem motor. As mudanças são visíveis de ano para ano, e este verão fui surpreendido com algumas novidades bem interessantes. A zona do centro, perto da marina, foi dotada de novos passeios, novos estacionamentos para bicicletas e, coisa muito rara em Portugal, ciclo faixas pintadas no asfalto.

É... uma... ciclofaixa!!!!

Tem o boneco e tudo!

E que tal uma coisa assim nas avenidas de Lisboa?

É claro que as preocupações urbanísticas da gestão do resort de Vilamoura, e recordo que este não é espaço público no sentido a que estamos acostumados, são também ornamentais. Além de ciclo faixas e estacionamentos para bicicletas, Vilamoura apresenta também extensas áreas jardinadas, elaborados passeios pedonais ou mistos (peão + bici), mobiliário público exótico e outras mordomias a que não estamos acostumados no resto do país. 

Vistoso e funcional estacionamento para bicis. Sem bloquear o passeio!

Por vezes tenho dificuldade em perceber se o fomento do uso da bicicleta por estes lados é para levar a sério ou não terá a ver com a tendência eco-friendly cosmética e inconsequente que tanto me irrita em Lisboa. Em Vilamoura também existem ciclovias absurdas e inúteis em cima de passeios estreitos. Ou ciclovias que começam no meio do nada e acabam em nenhures. Também há estacionamentos "rompe rodas" em locais impróprios. Quero acreditar que se trata de falta de experiência e das inevitáveis dificuldades de implementação de medidas bem ponderadas numa realidade que, apesar das suas particularidades, ainda é muito enlatado-centrica, como o resto do país.

Alguém reconhece esta bicla?

Assim, Vilamoura apresenta-se como uma espécie de precursora portuguesa para aquilo que o resto das cidades e vilas do país podem fazer. Apesar das características especificas de Vilamoura, não vejo razões para que não sirva de exemplo para outras paragens. Além do que tenho vindo a reportar, em Vilamoura também se está a estudar um sistema público de bicicletas de uso partilhado e já é possível alugar comercialmente bicicletas na vila. A nível local, parece-me uma terra que está a trabalhar em todas as frentes para uma mobilidade mais sustentável.

Ciclovia partilhada em Vilamoura.

Prevejo abjecções quanto ao facto de isto ser coisa de ricos. Vilamoura terá ciclovias e ciclo coisas (e jardins e fontes...) porque é uma terra de lazer e com dinheiro de sobra. Uma terra sem dinheiro e que viva da industria e dos serviços tem é que se preocupar com os famosos "bons acessos e mais lugares de estacionamento" e será forçosamente mais feia e perigosa para ciclistas. Não concordo. É uma questão de prioridades. Quando os responsáveis da autarquia de Lisboa começarem a ganhar coragem para retirar espaço e financiamento ao Grande Deus Automóvel e começarem a preocupar-se mais com a segurança e qualidade de vida das pessoas, talvez descubram que isso afinal não sai assim tão caro, pelo contrário.

Acho que já tenho saudades do Verão de 2011...

Não posso concluir sem um especial agradecimento à Ana, não só pela bicicleta de empréstimo, como pela organização de umas inesperadas e soberbas férias a Sul. Os pacientes modelos fotográficos improvisados Comandante Pedro e Co-Habitante também não estão esquecidos. Agora que a maioria regressa à labuta diária, espero que as energias venham também recarregadas, a cidade de Lisboa ainda apresenta muitos desafios ao ciclista utilitário, mas as coisas têm vindo a melhorar e com a ajuda de todos podem melhorar ainda mais. Não percam o fôlego e boas pedaladas.   

10 comentários:

  1. E para os betêtistas Vilamoura também tem oferta. Muitos e muitos kms.

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  2. Não tive tempo para BTT, mas gostava de explorar o estado da ecovia do Algarve, que passa por Vilamoura.

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  3. A ecovia em Vilamoura é toda em meio-urbano e anda por ali ás voltas sem piada nenhuma. Quanto a mim deveria passar junto ao mar e pela marina.As zonas em terra batida ficam junto da ribeira e na zona de pinhal,na zona agrícola. Já fora da Vilamoura temos um trilho espectacular junto ao mar e pela falésia até à Aldeia das Açoteias, mais de 3kms espectaculares de puro prazer com algum perigo à mistura.

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  4. Dez princípios básicos para a mobilidade urbana sustentável

    O Institute for Transportation and Development Policy (ITDP) desenvolveu uma publicação que apresenta 10 princípios para que as cidades possam encarar os desafios.

    A) Andar a pé: é preciso garantir espaços seguros, desobstruídos e de qualidade aos pedestres;

    B) Não-poluentes: deve-se criar condições ao uso de transportes não-poluentes, como a criação de ciclovias;

    C) Transporte público: oferecer transporte público de qualidade, que supra as necessidades dos passageiros;

    D) Controle de tráfego: criar restrinções a carros em locais de grande circulação de pedestres;

    E) Serviços delivery: fazer as entregas da forma mais segura e limpa possível;

    F) Integração: é preciso integrar pessoas e construções, possibilitando lazer, trabalho e outras atividades em espaços próximos;

    G) Preencher espaços: com o preenchimento de espaços vazios, como terrenos baldios, possibilita essa integração do item F, tornando as atividades possíveis a pé, por exemplo;

    H) Preservação dos bens: preservar a diversidade sociocultural, os ambientes e belezas naturais da cidade;

    I) Diminuir distâncias: criar conexões entre lugares, possibilitando caminhos diretos e livres;

    J) Durabilidade: planeamento e uso de materiais de qualidade, posterior manutenção.

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  5. Também fiquei muito bem impressionado, não tanto com a infraestrutura - apesar de ser muito apreciável - mas sobretudo com o nível de utilização. Haverá certMente uma quota-parte "eco-friendly", mas não se pode esperar que a massificação do uso da bicicleta se faça à custa de militantes da mobilidade urbana em bicicleta ... Chamo apenas a atenção para o facto de o espaço ser realmente público, não obstante a génese do empreendimento. A principal diferença reside no facto de o domínio público municipal não ser gerido diretamente pelo Município de Loulé mas por uma empresa pública municipal (capitais maioritariamente públicos, com participação minoritária da Lusort)
    Claudio Monteiro

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  6. Hello, qual a marca modelo da bicicleta aqui em destaque ou melhor emprestada pela amiga? Obrigado e boas pedaladas para todos! BiclaSurfer :)

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  7. Boas! Não sei bem qual a marca, o quadro tem gravado "Meteor" a bicicleta era um modelo utilitário barato comprado já há uns tempos em França e depois trazido para Portugal...

    Bom ano e boas pedaladas

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. https://www.facebook.com/paulo.reis.3701/posts/933575943424013

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