domingo, 8 de julho de 2012

Pedalar ao Ritmo Frenético de Londres

Um grande autocarro vermelho nunca anda longe da roda traseira

Isto é malta que tem pressa. Muita pressa. Os Londrinos, quero dizer. Mesmo a andar a pé. Reparem que eu tenho não só um físico sedutor e portentoso, como a minha passada é lendária pela sua dimensão ciclópica e passo acelerado. Mesmo quando não tenho pressa. Mas aqui até eu sou sistematicamente ultrapassado por velhotas asmáticas com enormes mochilas às costas, crianças de três anos ou executivos do Barklays em fatos de milhares de euros.

Se as coisas são assim no passeio, acho que podem ir fazendo uma ideia do que será nas ruas, no asfalto de Londres. Eu já tinha falado da agressividade do trânsito londrino, mas agora posso elaborar um bocadinho mais. Penso que em parte tem a ver com as ruas aqui serem em geral estreitas e com muitos cruzamentos. Os automobilistas fartam-se de acelerar, travar, acelerar outra vez, parar. Ficam impacientes e aceleram muito o carro, mesmo que seja para andarem mais uma dezena de metros e voltar a parar. Há também muitas zonas de estacionamento lateral, com os carros parados a obstruírem a passagem, pelo que muitas vezes têm que esperar e passar alternadamente. Os ingleses também estacionam em cima do passeio, mas é muito mais raro do que em Portugal.

Percebem o que eu quero dizer?
 
Depois há faixas BUS por todo o lado, sentidos proibidos, semáforos, etc. Tudo isto torna o uso do carro pouco lógico, mas o vício aqui também é muito grande e na prática as pessoas acostumam-se a lutar pelo espaço disponível, na esperança e chegarem uns segundos mais cedo ao centro comercial ou lá onde eles vão. As estradas estão também cheias dos omnipresentes autocarros vermelhos, que na verdade pertencem a várias companhias privadas diferentes. Estes mastodontes de dois andares (também há dos "normais") juntam-se à grande luta por espaço na capital britânica. O mais recente componente nesta selva urbana é pois o ciclista, que é literalmente atirado às feras. O que ajuda a explicar várias elementos típicos do ciclista londrino:

  • A roupa tipo guerreiro florescente. Num ambiente tão agressivo, numa terra com tantos dias cinzentos, com má visibilidade, usar roupa de alta visibilidade, como lhe chamam, faz algum sentido. Mesmo que seja horrível. Os motociclistas também recorrem a este visual.     

  • O uso de bicicletas de estrada e outros modelos de corrida. Se o commute é para ser feito à máxima velocidade possível, tentando acompanhar o fluxo do trânsito motorizado, faz sentido utilizar uma bicicleta veloz. E como eu já disse, o pessoal aqui está sempre com pressa.

  • O estilo agressivo de condução. Os automobilistas são os mais agressivos, mas toda a gente acaba por agir mais ou menos da mesma maneira. Os autocarros partilham as faixas BUS com os ciclistas e não parecem muito contentes com este facto. Sinto-me mais seguro com um autocarro da Carris por perto do que com estes tipos, por incrível que pareça. Os ciclistas acabam por entrar no jogo, mas quando saem magoados as pessoas só falam de como eles são "loucos" e "perigosos", quando todo o trânsito aqui é particularmente violento e os ciclistas são, como sempre, os mais desprotegidos.

  • O uso de licra e roupa desportiva. Se é para ir fundo e dar uma de guerreiro do asfalto, é natural que se transpire (e/ou se borre as cuecas). Nesse caso, faz sentido utilizar roupa práctica para esforços fisicos prolongados, que será trocada no destino por alguma coisa mais trendy

Quando não são os autocarros, it's the man with a van!

Resumindo e simplificando, que a mim ninguém me paga para ser rigoroso, acho que andar de bicicleta em Londres não é claramente para todos, embora a ideia é que assim venha a ser. Há muitos ciclistas na estrada, são um grupo visível e que já não pode ser ignorado, mas não foram criadas grandes condições para os proteger. Dito isto, muito trabalho foi de facto feito, desde a sinalização vertical às marcações nas estradas e às alterações legislativas, mas quase sempre na óptica do veicular cycling, infelizmente. Os números de acidentes parece ter forçado as autoridades a realizarem campanhas de sensibilização, mas como em outros locais o que se tenta é criticar e disciplinar o utilizador mais vulnerável, sem fazer grande coisa para o proteger.

Tudo o que está a acontecer em Londres é importante por causa das semelhanças com Lisboa. esperemos que não se venham a repetir os mesmos erros, ainda para mais com muitos anos de atraso. O Bike Snob esteve por cá não há muito tempo e também teve uns comentários (im)pertinentes sobre o que é pedalar por estas bandas. Leiam que vale a pena. Mas depois voltem.

1 comentário:

  1. Costumo andar a pé e de transportes públicos neste país onde quem não tem carro é considerado um misfit. Em todo o caso, ainda não ganhei coragem para aderir à minha bike pois penso que estamos longe de te condições mais seguras...o que é uma pena pois os passes sociais estão cada vez mais caros e por melhor que seja a minha boa vontade, é tramado andar a pé 10 a 20km todos os dias. Há que manter a esperança de que as coisas vão melhor. Basta que as elites, como é costume, atinjam as modas estrangeiras (que já andam há MAIS QUE TEMPO) e depois torna-se chique andar de bicicleta e finalmente "criam-se" os meios.

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