quarta-feira, 5 de setembro de 2012

De volta ao faroeste: Lisboa no Outono

Isaltino: o homem, o herói, a lêndea viva

Esta fotografia é uma espécie de alegoria do nosso país. Vejamos: temos um querido líder, eternamente reeleito apesar de todas as evidencias e condenações, colocado encima do símbolo de status e poder preferido da Portugalidade, o automóvel, a fazer uma demonstração da sua escassa inteligência. Ao longe, o povo aguarda, como sereno espectador apenas, pelo desfecho de acontecimentos sobre os quais sente que não tem qualquer controle, nem responsabilidade

Não me quero parecer com o cliché do emigrante retornado da França, mas regressar a Lisboa significa voltar à má educação das pessoas nos transportes públicos, ao grosseiro desrespeito pela vida dos outros no trânsito, aos políticos corruptos, imorais e inimputáveis, à interminável burocracia e incompreensível incompetência. Regressar à terra das regras pouco claras e das autoridades muito pouco preocupadas em fazê-las cumprir. Lisboa da caca de cão, dos espaços públicos decadentes, dos passeios usados para tudo menos para andar, e das celebridades provincianas. A lista é muito longa e deprimente.

Andar de bicicleta em Lisboa implica deixar de poder circular na relativa segurança dos corredores BUS, não dispor de ciclo-faixas, não ter sinalização específica. Em Lisboa sou obrigado por lei a circular em "ciclovias" desenhadas por macacos vesgos (onde elas existam), e não por onde for mais seguro e conveniente para mim. Em Lisboa tenho que, legalmente, circular encostado à berma direita, de modo a que os automobilistas não tenham que perder tempo para me ultrapassar. Em Lisboa muitas ruas são na prática autoestradas, com múltiplas faixas, onde se praticam diária e impunemente velocidades criminosas. E em Lisboa terei pouca companhia de outros ciclistas, uma raridade de excêntricos e probretanas, aos olhos da maioria iluminada.



Nem tudo é mau no entanto. Prova disso é a realização do primeiro campeonato Brompton em Portugal, no dia 22, na Praça do Império. Conversando com alguns donos de lojas de bicicletas lisboetas que vendem as lendárias bicicletas dobráveis, feitas à mão aqui mesmo em Londres, fiquei com a ideia que estavam a ser um sucesso de vendas. Este evento confirma essa ideia. Uma cidade que organiza um campeonato Brompton só pode estar pelo menos a caminho da civilização. Esperemos. E para quem não faz a menor ideia do que se trata, espreitem isto:



On other news, uma das possibilidades de melhorar as condições de circulação para ciclistas em Lisboa é recorrer ao Orçamento Participativo. A edição deste ano está na fase de apresentação dos projectos que sobreviveram à pré-selecção da CML.



A proposta em que estive envolvido foi fundida com outra, por razões que só a CML saberá. Tem agora o número 151. Fico com a ideia que eles pretendem gastar o orçamento destinado OP em coisas para as quais a CML precisa de dinheiro, mas não quero ser mal pensado. As esperanças de que o projecto saia mesmo assim vencedor e que depois seja de facto executado, e tecnicamente bem executado são compreensivelmente reduzidas. Mas a esperança é a última a morrer.

Muitos mais sinais como este, será possível Sr. Costa?

Enquanto vou tendo pesadelos sobre o meu regresso à capital portuguesa, vou fazendo preparativos para levar a minha bicicleta inglesa para lá. Tendo descoberto recentemente a utilidade de uma bicicleta de estrada para o transporte utilitário, espero que a Raleigh seja um sucesso também em Lisboa e ajude a navegar em segurança a selva de enlatados. Só tem que sobreviver aos bagageiros da TAP primeiro.

Sem comentários:

Enviar um comentário