segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Nobody likes you




Retirei o título deste post de uma tirada de um conhecido filme dos anos noventa protagonizado pelo Bruce Willis. O monólogo prossegue com as frases "everybody hates you. You're gonna lose. (...)"

Este bem podia ser também o diálogo que um ciclista urbano tivesse com o seu espelho todas as manhãs, antes de sair de casa e se lançar, a pedalar, no caos motorizado da cidade de Lisboa. Bem sei que esta não é a temática preferida daqueles que, como eu, procuram promover o ciclismo utilitário, mas as coisas são como são.

Quem nunca teve que se desviar in extremis de uma colisão frontal com um qualquer Schumacher do Cacém em ultrapassagem pré-orgásmica na estrada nacional? Quem nunca se sentiu o alvo de um improvisado concurso juvenil de arremesso de pedras, lixo e outros objectos? Quem nunca teve um psico-automobilista a fazer-lhe uma razante a alta velocidade com buzinadela incluída, na tentativa de provocar uma queda? Quem é que nunca foi insultado e intimidado pelo simples facto de se deslocar de bicicleta? Se nunca passou por todos estes cenários, é porque não pedala regularmente.



É claro que isto são os comportamentos sociopáticos, e eles existem, mas felizmente nem são tão abundantes como isso. O grande inimigo do ciclista é simplesmente o condutor/a distraído e ignorante, que acha que o código da estrada é apenas um conjunto de sugestões e não faz ideia o que possa significar a expressão "margem de segurança". Ou seja, quase todos os automobilistas portugueses. O problema não é só nosso. Os portugueses bem se esforçam, mas o cobiçado título de piores condutores do mundo tem outros pretendentes. E em qualquer lugar onde o moderno trânsito motorizado partilha espaço com ciclistas, as coisas têm tendência a correr mal. Para o ciclista.

Se isso parece até certo ponto inevitável, é mais difícil de entender o ódio visceral que alguns parecem nutrir pelos ciclistas. Será que parecemos tão diferentes que se torna fácil dizer publicamente coisas que pareceriam inadmissíveis se fossem dirigidas a outro grupo/classe?

Não tem graça, mas não anda longe da verdade

No Facebook há quem incentive o ódio ao ciclista e se dedique a falar mal do que parecem entender como uma ameaça e uma praga. Como estes tipos. O YouTube alberga também inúmeros vídeos de ódio, basta fazer uma pesquisa. No principal fórum português de ciclismo, há inúmeros relatos de situações arrepiantes vividas nas nossas ruas e estradas. (De tal maneira que deixei de lá ir). Mas as más noticias não são difíceis de encontrar. Também a policia, aparentemente, gosta de bater em ciclistas, um pouco por todo o mundo. E cronistas de várias origens e cores políticas adoram atacar o alvo fácil que é o ciclista urbano, do alto dos seus púlpitos mediáticos. Não só por cá, mas no UK ou em Espanha.

Até o brilhante George Carlin não resistiu a fazer umas piadas fáceis sobre ciclistas, recorrendo à prática habitual de reduzir a bicicleta ao estatuto de brinquedo e o ciclista ao papel do estranho, o outro, suficientemente diferente para sobre ele poder recair impunemente todo o tipo de violência.

É prudente não esquecer que o código da estrada não nos protege, muito menos as autoridades. E que na estrada somos os mais vulneráveis. A nossa maior arma é a inteligência, e quem escolhe deslocar-se de bicicleta já demonstrou ter inteligência acima da média. Mas é preciso não facilitar, não baixar a guarda. Acabando como comecei, com uma cinematográfica tirada pirosa em estrangeiro: "best defence is no be there". 

4 comentários:

  1. Se o acidente do video fosse em Portugal o ciclista é que tinha a culpa. O nosso código da estrada é uma vergonha.

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  2. É verdade. Também foi a primeira coisa que me veio à cabeça quando vi o vídeo...

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  3. É por estas e por outras que desisti de andar de bicicleta. Andei durante meses aqui na margem sul, mas depois de me terem tentado atropelar de propósito (maioria das vezes camionistas e construtores civis) demasiadas vezes, achei que estava a abusar da sorte. Nem imaginam a pena que sinto cada vez que tenho de ir à bomba de gasolina largar dinheiro suficiente para comprar uma bicicleta boa de x em x meses, só porque, de certa forma, estou proibido por várias bestas de andar de bicicleta. Parece que tou a pagar pela vida. Sim, sei que é cobardia. Ah, e quanto a ciclovias em Almada... esqueçam. As que existem mais parecem um insulto, era melhor não terem nada, porque assim pensam que está tudo feito.
    Fico a ferver num ódio a esta gente toda, mas é como este bom artigo diz, o ciclista é mais inteligente, tenho de ter calma... Não me importo nada que a gasolina suba a preços incríveis, esta gente parece que prefere morrer a andar a pé ou de transportes...
    Enfim, lá vou tendo cuidado com os ciclistas que apanho quando ando de carro, sei muito bem o que é estar do outro lado da trincheira. Para mim são heróis.

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  4. Lamento essa experiência. No fundo também não uso mais a bicicleta por razões de segurança: se fizesse a Marginal todos os dias de certeza que já cá não andava. Mas tenho arranjado maneira de incluir o uso da bicicleta nas minhas rotinas. Faço troços mais pequenos e vou conjugando o uso das duas rodas com os transportes públicos. A minha esperança é que progressivamente seja mais seguro fazer cada vez mais percursos.

    Um abraço e animo. "Eles" estão loucos, não precisamos de ficar nós também!

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