Obras da CRIL junto a um Ferro Velho |
Infelizmente, nas décadas mais recentes, a nossa paixão pelo transporte motorizado tem trazido mais problemas que benefícios. Como com qualquer vicio, o prazer inicial perdeu-se e agora é só um mau hábito que não queremos admitir, mas um que ameaça o resto das nossas vidas. Nega-lo é como negar a Lua ou o nascer do Sol. Mesmo assim, é o que fazemos. Apesar das nossas caríssimas autos-estradas e automóveis sofisticados, os acidentes de viação matam mais pessoas por ano do que a guerra colonial alguma vez conseguiu. Basta ver os números. No entanto, na nossa cultura, estes factos são sistemáticamente ignorados.
Os meus vizinhos adoram estacionar no passeio |
Os pais super-protectores de hoje em dia, que vivem permanentemente obcecados com a segurança e conforto das suas crianças, fazem questão de as levar todos os dias à escola sempre de... carro, pois claro. Para sua segurança, supostamente, ignorando que uma das maiores causas de mortalidade infantil e juvenil são justamente os acidentes de viação.
Carcavelos, perto da estação da CP |
Esta é uma rua adjacente à estação de comboio de Carcavelos. Existe um parque de estacionamento público, do outro lado da linha, construído propositadamente para os utentes da CP, mas é pago. Está sempre vazio. Como não existe fiscalização, muitos condutores preferem aqui deixar as suas viaturas, o dia todo. O passeio, o único digno de esse nome na rua, fica intransitável e os pões deslocam-se pela faixa de rodagem, onde os automóveis não abrandam nem dão espaço, porque "as pessoas é que estão na estrada". Situações como esta repetem-se por todo o país, dia após dia. Há uma impunidade total. Imaginem que em vez de carros em cima do passeio fossem tendas, montadas por particulares e ali deixadas. Seriam toleradas? Ainda lá estariam ao fim do dia, incólumes? E vocês perguntam, "porque havia alguém de montar uma tenda em cima de um passeio??" Eu penso o mesmo de um automóvel.
Lisboa, não há muito tempo |
Durante anos, ninguém questionou que as nossas ruas e pracetas se transformassem em sobre-lotados parques de estacionamento. Ninguém levantou a voz, quando os passeios desapareceram e os jardim encolheram, para acomodar mais carros e mais faixas de rodagem. Ninguém objectou que as avenidas se transformassem em vias rápidas, ninguém se queixou quando as crianças já não podiam ir a pé para a escola, porque os passeios não existiam, os pais moravam demasiado longe, e era "demasiado perigoso". Ninguém quis saber dos idosos que ficaram isolados em suas casas, incapazes de navegar a nova selva, de atravessar uma estrada nos míseros segundos que os semáforos lhes concediam. Nada disto se questionou, porque o automóvel era o progresso, e na mente de muitos, ainda é.
Felizmente, no meio da ignorância, começa a surgir a luz. A praça do comercio já foi um estacionamento público! Olhando para ela agora, temos que ter esperança. E denunciar o tabu.
A foto do VW a espreitar pela janela não teria tanta piada se eu não conhecesse tão bem o sítio!
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